
Sendo este um espaço de marés, a inconstância delas reflectirá a intranquilidade do mundo.
Ficar-nos-á este imperativo de respirar o ar em grandes golfadas.
não me digam que ainda é cedo, porque Abril é sempre
Em cada ano celebro Abril com um poema que dedico à Associação 25 de Abril (https://a25abril.pt/), de quem muito me apraz registar o bom acolhimento.
Aqui vos deixo o meu poema para o 47º aniversário do «dia inicial, inteiro e limpo», tal como Sophia também o imortalizou:
NESSA MANHÃ CINZENTA MAS RADIOSA
é Abril que está a chegar
meu filho por nascer
é Abril que te vou dar para que possas florescer
rubro cravo a dar cor à madrugada
transformada em rumo e estrada a percorrer
sacudido o manto frio do inverno
no inferno de uma guerra sem saída
é o tempo de dar tempo à nossa vida
e colher todo o ardor da primavera
mas não é tempo algum de estar à espera
de ilusões
de quimeras
sonhos vãos
é Abril e como vês
somos irmãos
e marchamos lado a lado neste chão
ao encontro do futuro
mão na mão
e o futuro é o Abril que nós fizermos
se quisermos ir além da servidão
é Abril
meu filho
assim quisemos
mas é este o Abril que ainda queremos
e este Abril é a nossa redenção.
- Jorge Castro
Abril de 2021
breves (ou nem tanto) reflexões ao correr da pandemia, dos feicebuques e outras enormidades…
Reflexão matinal recorrente: tenham mesmo muita atenção aos correctores ortográficos automáticos.
Acabei de tentar escrever “pitrol” e o corrector achou que devia ser “patologia”. Insisti e sugeriu-me “pito”. Felizmente não estou no norte do país…
XXX
Alguém que me explique, por favor e com clareza, o que se deve entender desta frase, propalada, por estes dias, aos quatro ventos em diversos órgãos de comunicação:
«AstraZeneca restringida na Alemanha a utentes com menos de 60 anos»
1- Limita-se a sua aplicação a utentes com MENOS de 60 anos?
2- Limita-se a sua aplicação a utentes com MAIS de 60 anos?
É que «restringir» é sinónimo de «limitar», pelo que deveria entender-se o nº 1… Mas o que as notícias vão dizendo é que a vacina apenas deve ser aplicada a pessoas com mais de 60 anos.
Será só porque o termo «restringida» está, como me parece, mal aplicado?
Estou (outra vez) confuso.
XXX
Um juiz mediático (…?…) a debitar razões justificativas para que um bando de arguidos possa permanecer com tal estatuto, ou talvez não?
Obrigado, mas passo.
Desculparão, mas tenho a vida ali fora, à minha espera, com muito que fazer. Logo à noite, tenho a certeza de que alguém me fará um resumo…
XXX
Fábula da fábula:
Era uma vez um Ivo. Tanto leu, tanto escreveu e tanto se condoeu que, por fim, já era um Crivo. Crivo e rosa do esforço, leu, releu e, enfim, tresleu… e tudo se escafedeu, já sem a corda ao pescoço…
Na Comporta, os lagostins e outros bichos afins, a brincar aos pobrezinhos, nos extensos arrozais, rejubilam, coitadinhos: p’rà cadeia, nunca mais!
XXX
Agora, só mesmo um bocadinho mais a sério:
- Se é certo o que Sua Magnitude Judicial, D. Ivo, nos diz, como é que se deixa prescrever, em Portugal, um crime de corrupção que envolve tão altas instâncias nacionais – para não lhes chamar alguma outra coisa de que venha a arrepender-me…?
Estamos anestesiados, bêbedos ou comprados?
XXX
Tão ingente era o processo, tanta gente se envolveu que, no fim, nunca fez tanto sentido o dito, atribuído a Horácio:
Parturient montes, nascetur ridiculus mus! (Que é como quem diz: os montes parirão e nascerá um ridículo rato).
E, acrescento eu, sic transit gloria mundi… (mas as outras televisões também por lá andaram).
Definitivamente, com todo este processo deu-me para latir (ainda que a vontade fosse uivar…), muito a propósito, colhendo nas Sátiras do mesmo autor:
(…) est modus in rebus, sunti certi denique fines,/ quos ultra citraque nequit consistere rectum…
O que, para quem não se tenha iniciado em latinices e antes que cuidem que estou para aqui com reflexões escatológicas sugeridas pela má digestão do processo, sempre informo que se trata de qualquer coisa como:
(…) há uma medida nas coisas; há, enfim, limites precisos além dos quais e aquém dos quais não é possível existir o que é justo…
Do Horácio dir-se-ia que até parece que é bruxo!
XXX
O estado a que isto chegou (se nos lembramos de Salgueiro Maia…)
Entenda-se uma coisa: não estou para aqui de virgem pudica a rasgar as vestes, ingenuamente, por toda aquela tragédia grega monocórdica de ontem, com Ivo Rosa supostamente a recolocar a Justiça no seu pedestal intocável e inamovível e cerrando com tal determinação o seu punho justicialista que toda a areia que essa mão continha se escoou por entre os dedos para as salsas ondas, onde se desvaneceu.
Não estou, pois, nem quero estar, a esquecer distraidamente os submarinos ou os bancos do nosso descontentamento, bem como todos os protagonistas do peripatético mas constante «arco da governação» que se vão agasalhando às nossas custas e da nossa complacência eleitoral.
Não quero, ainda e enquanto cidadão, ilibar todos os políticos que apregoam – e são todos ou quase – que «à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça», enquanto sob os seus olhares distraídos, cúmplices ou coniventes se cometem os bárbaros desmandos a que assistimos, regularmente, de há muitos anos a esta parte.
Afinal, para quê invocar a independência da Justiça se todos os seus agentes se queixam e padecem da mais atroz dependência, no que toca a meios, nomeadamente, onde não têm qualquer autonomia nem, pelo que nos dizem, grande capacidade de decisão sobre a matéria? Independência de quê e como?
E tudo isto fede porque o resultado final é vivermos no País mais empobrecido da Europa e isso resulta apenas do que fica dito nos parágrafos anteriores e não por qualquer tipo de pobreza endémica, falta de recursos ou impreparação da população.
Estamos, alegremente, submetidos a uma carga tributária – aqueles que pagam impostos – que, essa sim, bate recordes europeus, pois nenhum governo pode, quer ou consegue ter a veleidade de possuir cobertores que cubram a cabeça sem destapar os pés.
Os exemplos de desgovernação e atropelo dos interesses das populações são diários e constantes, perante a generalizada pasmaceira dos cidadãos.
Veja-se um caso: uma amiga minha está a contas com uma denúncia feita na PSP por um seu vizinho porque tem três galinhas garnizés… e o Estado considera que aquela posse deve ser declarada ao fisco. Podemos presumir que seja pela insustentável produção de ovos e o concomitante rendimento… Ah, também há o «chip»… que, já agora, não sei se será extensivo aos caracóis e lesmas que pululam na minha hortinha e que, segundo apurei, também serão filhos de Deus.
E assim vai o cidadão na corrente destas pequenas-grandes arbitrariedades, ainda para mais neste tão pernicioso tempo de pandemia que propicia um olhar intenso sobre a formiga enquanto, por trás desse olhar escrutinador, passa uma manada de elefantes.
E aquilo a que assistimos ontem não terá sido mais do que um soberbo exemplo de mais um monumental cortejo pela passagem de uma manada de elefantes.
Mas ai se a malta se organiza, que então cai o Carmo e a Trindade… e o resultado prático é a aceleração dos desmandos «antes que os gajos se organizem melhor e se convençam de que têm algum poder».
Estou a lembrar-me de dois casos paradigmáticos e que estão por aí, vivinhos da costa e em curso: a venda da concessão das barragens transmontanas ou a urbanização desmesurada anunciada para a faixa de Carcavelos junto ao mar.
Motivações diversas, circunstâncias não comparáveis, mas um denominador comum: o total e ostensivo desprezo pelos interesses das populações envolvidas ou, sequer, das suas opiniões, por parte dos «mandantes», dos públicos aos privados, unidos na mesma urdidura de interesses.
E toda esta reflexão agoniada porque, aparentemente, a uma parte da Justiça desta terra, à mulher de César nem interessa ser séria… desde que o pareça. E parece-o apenas porque é ela própria quem o diz e a malta acredita.
Estamos, pois, conversados e tenham um bom fim de semana.
XXX
Porque há alguma tendência para leituras «transviadas», aqui fica um pequeno sublinhado que decorre de algumas dúvidas suscitadas sobre um meu texto, clarificando a minha opinião acerca da atitude de Ivo Rosa:
- O Ivo Rosa é, neste momento, a «cara» que nos aparece pela frente, em circunstâncias em que apetece bater em alguém. Mas é apenas isso.
Em minha opinião e valendo o que vale, a responsabilidade TODA deste imbróglio é, claramente, do Ministério Público e da forma desastrada, incompetente e nada clara como geriu todo este «mega-processo», como se lhe costuma chamar, ao longo destes infindáveis anos.
Como se costuma dizer e admitindo até a possibilidade de erro, errar é humano. Mas sabemos também que errar demais é, geralmente, desumano. E, pelo que soubemos, foi este o caso.
Ivo Rosa limita-se a discorrer sobre o processo, com os instrumentos que a lei lhe coloca ao dispor. E a arcar com o odioso de o comunicar ao país.
Nada, pois, de leituras apressadas. O problema é a corrupção e os corruptos passarem, sistematicamente, incólumes, aparentemente graças a um sistema judicial (ou agentes seus) eivado de iniquidades.
Volto a perguntar-me: como é possível e com que fundamentação é que um crime de corrupção deste quilate pode prescrever?
poema das fracas rimas em -ado
jamais consegui voar e bem tenho eu tentado
tento voar quando sonho mas nalgum sonho acordado
entre um copo de medronho e algum serão bem passado
quando chega a primavera – é um dos sonhos sonhado
ao ver voar abelhões e eu para aqui sentado
quando o inverno é uma fera e se fica enregelado
olhando voar o fumo ou um papel mal queimado
quando a notícia me traz um futuro amordaçado
ou o presente nos faz ficar assim ou assado
indiferentes como aquele caminhando ao nosso lado
a voar só na aparência estando afinal parado
pois é o mundo que roda embalando o nosso fado
agora então – voar como? – assim para aqui confinado
com as asas sabotadas e o viver amortalhado
correntes na liberdade e futuro congelado
num medo frio de fome roendo um pão estragado
jamais consegui voar e bem tenho eu tentado
da passarola ao avião ou noutro objecto alado
mesmo aí de pés no chão não voo sou só levado
eis então que me redime a palavra que buscava
e largo as rimas em -ado
e voo como sonhava.
- Jorge Castro
29 de Março de 2021
o poemículo dos subentendidos
(isto só pode ser «overdose» do dia dos poetas ou excesso de pólen primaveril…)
ser poeta é uma arrelia e a poesia uma treta
coisa de fazer azia por dá cá alguma peta
não nos fiemos nas flores
nos madrigais
nos amores
uns figadais outros mais ou menos destemperados
que eles dizem querer ir aos fados
mas anseiam bacanais
ah o mundo que lá vem e o outro onde eu quero ir
mas só se vieres também que a coisa está de fugir
deixa-me fazer-te um verso tão profundo e pertinaz
que se leia pelo inverso e da frente para trás
que ninguém bem o entenda mas que se estenda pela rua
gritando não estar à venda mas vendido até na Lua
é garantido sucesso
flor de sal da literatura
probóscide ou abcesso
abstrusa criatura
ganhará fama e proveito até ao momento grave
em que ao pôr-se tanto a jeito
nem é poeta
é uma ave
ou um pássaro bisnau planando ao sabor do vento
como sem leme uma nau voga ao rumo do momento
falo-te agora em papoilas
lunares ou
pior
cuidares que são moçoilas
campestres
com apetites rupestres disfarçados de alguidares
vá lá
não me jures perceber o que não é entendível
no limite diz-me ser algo assim meio impossível
mas que tem graça e inspira
o estro
o astro
e o mastro daquela nau à deriva
mas que transpira poesia tal qual uma almotolia
transporta o azeite do dia
oleando
oleando
olé-olé até quando…?
- Jorge Castro
23 de Março de 2021
celebrando o Dia da Poesia
um dia como qualquer dia
tenhamos sempre presente
que é criação a poesia
é a palavra liberta
por vontade ou acidente
sob um vento de feição
é a nau à descoberta
com o velame e o leme
ou o sonho mais estreme
que nos traz a língua-mãe
onde campeiam afectos
epopeias e tragédias
gritos-lamentos também
mas também de uma revolta
de amor na palavra à solta
e todo o entretecer de teias
que nos levam mais além
de algum viver comezinho
de algum estar sem sentido
onde vamos sem ter volta
a tolerância do nada
e a intolerância do tudo
onde a vida quase acaba e o viver fica mudo
é o dia de voarmos para fora desse enredo
desse ninho
desse medo
em busca de uma aventura
sendo nós a criação mas também a criatura
no ensaio de uma vida
que é feita de todos nós
onde é cada um poeta
tanto maior essa meta de jamais ficarmos sós
e há-de ser esse o dia
em que nasceu um poeta e deu à luz poesia
- Jorge Castro
21 de Março de 2021
lembrar os amigos nunca é demais
Associá-los à Cultura, por maioria de razão. Hoje, por circunstâncias fortuitas, tropecei com esta feliz e oportuna entrada de Ana Sofia Paiva, que funde António Gedeão, Mário Piçarra, Águeda de Sena e Olga Roriz.
Com os meus agradecimentos à autora e para quem não conheça a versão musicada que Mário Piçarra criou para o poema de António Gedeão, a Calçada da Carriche – nas palavras de Tito Lívio, a melhor versão musicada deste excelente poema -, aqui fica, em fundo… e para ouvir até ao fim:
«Carta Verde», o Estado… e eu
Esta croniqueta poderia chamar-se «tudo a favor do privado, nada contra o privado» ou «uma nota autobiográfica exemplificativa do meu espírito miudinho».
Recebi hoje, da seguradora com quem tenho contrato obrigatório para a minha viatura, uma mensagem onde constava, em anexo, a minha «carta verde» actualizada.
Como foi a primeira vez que ocorreu tal modalidade, pois que a recebia por via dos CTT, tentei apurar se estaria tudo em circunstâncias legais. E está.
Por força da Portaria 234/2020, de 08 de Outubro, a «carta verde» deixa de ter a obrigatoriedade legal de ser verde… porventura para não ser confundida até com algum marciano, agora com estas viagens de ida e volta para Marte tão facilitadas.
A «carta verde» passa, então, a ser branca. Maravilhas do progresso e das tecnologias, dir-me-ão. Mas atentemos no seguinte:
- Recebido o documento por email, há que imprimi-lo, pois a obrigatoriedade de afixação da vinheta na nossa viatura não cessou. Passo, então, a ser obrigado a ter uma impressora instalada em casa ou a recorrer a algum serviço de impressão externo. Num caso e noutro, a expensas minhas.
- A seguradora deixou de ter o encargo dessa impressão, além de ter deixado de ter o encargo de expedição pelos CTT.
Devo, portanto, presumir, que o seguro que pago vai baixar na devida proporção da diminuição desses custos. Ou não? É que o «resíduo» que me caberia, multiplicado por muitos segurados, deve representar uma diminuição jeitosa de encargos anuais para a seguradora.
Devo também presumir que o Estado presume que todos os cidadãos com seguro obrigatório para viaturas têm computadores e impressoras disponíveis.
Como a existência de uma Portaria leva a pensar que o Estado sabe o que se está a passar e como o Estado é o suposto garante dos interesses dos seus cidadãos, devo, ainda, presumir que o Estado já montou uma rede de impressoras, a nível nacional, que apoie os cidadãos, até o senhor Manel que ainda apascenta um rebanho lá nos confins da serra, mas tem uma lambreta para ir ao médico à cidade mais próxima…
Depois, admirámo-nos dos rendimentos pornográficos de gestores como Mexia e Companhia. Como é diferente o privado em Portugal…
presidenta? (serviço público)
Pela mão do meu amigo João Paulo Oliveira, recebi hoje uma notícia chocante: a palavra PRESIDENTA existe!
Do acanhamento pela ignorância, passando pela estupefacção e desaguando na humildade, os meus ouvidos estremeceram.
Então, aquilo não era só um «feminismo» da Dilma Rousseff?
Pelos vistos e, consultando a Wikipédia, podemos confirmar: «A norma culta da língua portuguesa aceita as duas grafias – presidente e presidenta – como corretas e aceitáveis. Ainda em 1889, o Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Cândido de Figueiredo utiliza o termo “presidenta” significando mulher que preside e outros dicionários também o seguem; por exemplo, de acordo com o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, “presidenta” é o feminino de presidente, embora seja menos usual. Já o Dicionário Aurélio afirma que a palavra pode ser usada no masculino e feminino, apontando “presidenta” como “esposa do presidente” ou “mulher que preside”. O Moderno Dicionário da Língua Portuguesa Michaelis e o Dicionário Brasileiro Globo também atribuem a mesma significação que o dicionário Aurélio.»
No seguimento, apurei nos quatro dicionários – ou pai dos burros, como o meu pai lhe chamava – que existem cá por casa, do Houaiss ao Dicionário Prático Ilustrado da Lello… e a informação é unânime e concordante.
Em boa verdade, nunca podemos ter a pretensão de saber tudo… Tanto mais que, por exemplo, não existe o feminino de ESTUDANTE ou de vários outras palavras com a mesma ou idêntica terminação (descendente, ascendente, intendente, etc., etc.).
Será, pois, um dos muitos particularismos, chamemos-lhe assim, da Língua Portuguesa. Sendo certo, entretanto, que utilizar o termo PRESIDENTE referido a homem ou mulher, também não será incorrecto.
Aqui fica o apontamento, para minha e vossa salvaguarda, para além de diatribes ideológicas ou outros conceitos estranhos à nossa Língua-Mãe.
facturação por estimativa por parte das chamadas empresas de serviços – água, electricidade, gás…
Constou-me que a Associação Portuguesa do Direito de Consumo está a solicitar a intervenção da senhora Provedora da Justiça no sentido de esta prática ser considerada inconstitucional.
Esta é uma daquelas matérias que prova à saciedade o peso da influência de determinados poderes instalados na sociedade portuguesa sobre os sucessivos governos e em prejuízo dos seus clientes. Vejamos:
- As diversas empresas que se movimentam neste sector e as suas sucessivas mutações sempre estiveram sujeitas a regulamentações que recomendavam ou obrigavam à instalação de aparelhos de medição no exterior dos edifícios, por óbvia facilidade de leitura. Há basta legislação sobre o assunto.
Desta regulamentação sempre as empresas se estiveram nas tintas, para falar bem e depressa, até por conivências mais ou menos aberrantes com os patos-bravos que por aí pairam e as respectivas diminuições em custos de produção. - Como os “superiores interesses” destas empresas sempre prevalecem sobre o interesse dos cidadãos (com a despudorada cumplicidade dos governos), criou-se a figura das leituras por estimativa, uma “inovação” absolutamente indefensável porque a responsabilidade de efectuar cada contagem cabe às empresas e não ao cliente. Desde logo, não foi o cliente final que escolheu o local onde se encontra o contador, localização essa, aliás, sempre subordinada a autorização e vistoria prévias da empresa ou de alguma entidade por ela definida.
- Estas estimativas sempre foram motivo de contestação por parte dos utentes mas sempre constituíram um respaldo de facturação confortável para as empresas e, daí, o manterem-se até hoje.
- Sem sequer me alongar nos múltiplos efeitos perversos – que todos conhecemos – desta prática unilateral e abusiva, chegou-se recentemente ao despautério, já consignado na lei (!), de poder ser interrompido o fornecimento em situações de falta de acesso a um contador por períodos superiores a seis meses. Isto porque o legislador presume que o consumidor pode ser obrigado por qualquer empresa fornecedora de serviços a ficar retido em casa, para facultar as leituras da água, da luz, do gás… Como mero exemplo dos transtornos causados, que justificação apresenta o retido ao patrão para as decorrentes faltas ou atrasos?
Ou seja, penaliza-se e responsabiliza-se o consumidor por uma circunstância que foi originada pelo fornecedor. E assim vivemos, alegremente, pelo menos desde os primórdios de oitenta, altura em que tropecei, pela primeira vez, nesta realidade.
A Associação Portuguesa de Direito do Consumo está a mexer-se? Abençoada… A própria DECO não se agitou muito nesta matéria tão flagrantemente lesiva dos direitos do consumidor.
Enfim, venha o que vier, só peca por imensamente tardio.
Porque é que estou agora a falar disto? Ora, porque considero que é este tipo de comportamentos que mina a confiança do cidadão relativamente a quem o representa… e o incentiva a “defender-se”. O chico-espertismo de que se fala…
em defesa dos alentejanos e do Alentejo e, afinal, de Portugal
Muitos se espantam, se vergastam e rasgam as vestes pelos resultados das recentes eleições presidenciais no Alentejo. O «Alentejo vermelho» terá dado lugar a um outro Alentejo, purpura funéreo…
Em desacordo com muito do que se tem dito, vou, pois, opinar sobre isso, não em abordagem pseudo-científica, mas com a visão que a vida nos traz quando tendemos a olhar em nosso redor com olhos de ver e com a objectividade possível, perseguida em cada palavra.
O Alentejo mirífico, idealizado, das extensas campinas e trigais, cravejados de papoilas, do agreste trabalho de sol a sol e cânticos elevados em entardeceres magníficos já não existe… nem, porventura, terá alguma vez existido, nomeadamente para aqueles que, para sobreviver, tinham de dobrar os costados de manhã à noite, nas «campanhas do trigo» do Estado Novo, nas propriedades de meia-dúzia de latifundiários.
Esse Alentejo existe apenas nos cartazes turísticos e para fotógrafo ver, pois as experiências inovadoras e aventurosas que tiveram lugar com o 25 de Abril de 1974 rapidamente foram massacradas pelos grandes interesses do costume, até para não constituírem «maus exemplos», que tendem a propagar-se.
O Alentejo actual vive sem futuro à vista. As Catarinas de hoje não caem às mãos de nenhum Carrajola. Mas caem pela ausência de trabalho, de remunerações condignas, de ausência de futuro que as conduzem à emigração ou ao suicídio. O resultado, por fim, será o mesmo.
Qualquer jovem que intente a criação de uma empresa, ou tem pais com dinheiro para desperdiçar, ou cai, de imediato, sob o peso atroz dos impostos, das dificuldades imensas na obtenção de apoios institucionais, dos custos de produção, etc..
Quanto a empregos, basta pensar na precaridade e no montante espectacular do ordenado mínimo (quase metade do que existe em Espanha, sendo dos mais baixos da Europa e o que menos evoluiu nos últimos vinte anos – ver dados comparados em:
https://www.pordata.pt/DB/Europa/Ambiente+de+Consulta/Tabela.
Sobre isto acrescentem-se pequenas minudências como, por exemplo, termos a electricidade mais cara da Europa (sendo que ao preço do Kwh há que acrescentar os sacrossantos encargos de potência, o que ainda mais agrava o custo final…).
Entretanto, o seu património histórico e, neste, muito especialmente a imensa riqueza arqueológica que poderia definir o Alentejo como um dos pólos de turismo cultural da Europa, pela sua especificidade, quantidade e qualidade, é sistematicamente pilhado e/ou destruído, perante a passividade criminosa das «forças vivas», quando não da sua cumplicidade.
Uma investigadora na matéria informou-me de que, nos últimos 25 anos, 80% das referências arqueológicas que ela própria assinalara, no Alentejo, tinham desaparecido!
A título de exemplo, temos presente as muito recentes destruições deliberadas de antas como ocorreu na Herdade de Vale da Moura (Évora), para o plantio extensivo de olivais e amendoais, sem consequências visíveis até à data. Olivais e amendoais cujo produto final é muito duvidoso que venha a constituir riqueza nacional, pois escoa-se para parte incerta.
Junto ao litoral, as diversas «aventuras» de estufas instaladas dão (?) emprego miserável a migrantes, onde não se paga, sequer, o salário mínimo, e muito próximas, nas condições de vida proporcionadas aos trabalhadores, ao que se passava nas roças africanas nos anos 50 e 60 do século passado.
As reformas dos trabalhadores rurais – dos poucos ainda sobrevivos – são a desgraça vergonhosa que todos conhecemos.
Conheço um trabalhador da construção civil, já idoso, que faz uns biscatos de sobrevivência na região de Lisboa, durante a semana, regressando à sua terra, no meio do Alentejo, aos fins de semana onde, além do cultivo de uma pequena horta, se afoga em vinho à espera do próximo trabalho. Como rotina de vida, não será auspiciosa.
E como estaremos nos apoios à cultura alentejana, para além dos foguetórios televisivos, na esmagadora maioria dos casos inconsequentes e distorcidos, quando não totalmente alienados?
Neste «caldo de cultura», que apenas peca por defeito, o que é que cada um de nós, gente atenta ao drama social que Portugal vive, poderia esperar nestas eleições?
Poderemos nós achar estranho que nas Legislativas de 1987 a abstenção no Alentejo tenha sido de 27,5% – das mais baixas do País – e que nas Legislativas de 2019 tenha sido de 67,1% – das mais elevadas do País?
E vá lá, vá lá, que o PCP manteve, agora, quase inalterada a sua votação – ao contrário do que propalam os órgãos da comunicação a que temos direito… E se, aqui, os cinquenta e tal porcento de Marcelo contaram com os votos do PS – que não terá votado expressivamente em Ana Gomes – o Chega contou com os votos de quem? Vejam lá se adivinham…
Alguém que tenha o golpe de asa de cativar os jovens, poucos mas que ainda existem, do Alentejo, com políticas de futuro, positivas e sustentadas em circunstâncias reais e que proporcionem dinheiro no bolso – porque é para isso que se trabalha, concomitantemente com a dignificação pessoal; alguém que tenha o golpe de asa de proporcionar o conforto na velhice, em vez da desertificação doentia que tem sido promovida e, decerto, outros amanhãs virão a florir na terra sagrada do pão.