
Sendo este um espaço de marés, a inconstância delas reflectirá a intranquilidade do mundo.
Ficar-nos-á este imperativo de respirar o ar em grandes golfadas.
Otelo Saraiva de Carvalho
– um Homem do nosso Abril
Otelo Saraiva de Carvalho deixou o nosso convívio, hoje, com a idade de 84 anos, e a democracia que somos e que temos ficou empobrecida.
Figura polémica, controversa, contraditória, até, mas sempre apaixonada, de palavra fácil e coração ao pé da boca, era o que eu rotulo como um ser humano bom.
Talvez haja melhores mas, seguramente, há muitos piores. A ele, à sua entrega e disponibilidade em prol do ser humano, a par da de muitos camaradas de armas, devemos o êxito do derrube da ditadura.
Quem se “entretiver” com exercícios desviantes com invocações a “campos pequenos” e outros devaneios, peço o favor de que vá bater a outra porta. Tive o prazer de o ouvir em diversas situações e, até, de falar com ele. E dessa experiência vos digo que me sinto, hoje, deveras penalizado pelo seu desaparecimento.
Preservemos dele a boa memória.
a história do hidroavião revisitada…
Então, quer-se dizer (linguagem popular), um hidroavião cai, em França, e provoca um incêndio… e eu fico sem electricidade durante cerca de duas horas, em Cascais?
Para além de todas as conjecturas que possamos fazer, uma coisa me parece evidente: quando alguém fala em soberania nacional deve estar sempre no domínio da ficção. Ou, colocado de outra maneira, quantos portugueses sabiam que esta ocorrência era, sequer, possível?
Ah, em certos momentos, a electricidade que consumimos vem de França e até é muito mais barata porque eles têm diversas centrais nucleares. Ora, aí está: por isso é que passámos a pagar a electricidade muito mais barata, não é, meninas e meninos? Ou talvez não. Eu imagino, só os custos do transporte daquele energia toda, de lá tão longe. E, se calhar, é em pó, com camiões TIR e tudo… Isto quando se andava com estas coisas de burro saía muito mais em conta.
Melhor do que isso, só mesmo a electricidade que compramos a Marrocos, produzida em centrais idênticas à de Sines – que encerrámos – mas que não têm, nem de perto nem de longe, os pruridos ambientais que a nossa tinha. Como é diferente a energia, em Portugal!
Nota a posteriori – Felizes os tempos em que os apagões nacionais se deviam ao jacto de dejectos lançado por uma cegonha. Sempre era um animal já nosso afeiçoado, residente, que nem emigrava, dado o clima ameno. Imaginem, agora, o que será quando, num futuro próximo, algum panda, lá na longínqua China, se chatear com um CEO eléctrico qualquer, aqui em Portugal… É que isto anda mesmo tudo ligado… e não é só à corrente.
reflexão matinal
Gosto de ler. Entre muitas outras coisas, as opiniões dos outros. Devo, no entanto, lê-las com vagar, para as entender e interpretar ou, como diria, salvo erro, Fernão Mendes Pinto, lambê-las como a ursa faz aos filhos.
Esse é o caminho para evitar precipitações espúrias. Se não o fizer, qualquer que seja o motivo, nomeadamente a falta de tempo, não faz sentido pronunciar-me sobre o assunto, seja a favor, seja contra.
E vão, decerto, escapar-me muitas subtilezas de linguagem, em que somos pródigos. Vou, provavelmente, gerar controvérsias infundadas. Vou hostilizar, muito provavelmente, terceiros de forma gratuita…
Apenas por exaltação momentâneo do ego? Ora, há tanta forma e maneira de o exaltar. Basta pensar um pouco, exercício muito recomendável para quem tenha de si o conceito de “sapiens”.
Ler, pois, devagar. Também o melhor modo de discernir o trigo do joio.
Depois deste momento de reflexão, vou beber um cafezinho. Até já.
Helena Matos e a desinformação
Helena Matos dixit, no Observador, em 11 de Julho, p.p.: «Quando a SIDA apareceu nos anos 80 não se proibiu nada a ninguém. Em 2020, quando chegou o COVID proibiu-se quase tudo a toda a gente. Somos as cobaias de uma nova forma de governar: o social-sanitarismo»
Eu tendo a sentir muita consideração por todo e qualquer ser vivente e pondero sempre evitar meter-me nas tamanquinhas de cada um, até por razões profiláticas. Mas quando alguém partilha uma opinião, o mínimo que se espera é o seu eco, a ressonância produzida.
Assim sendo, quando alguém que se arvora em jornalista publica um artigo de opinião assume o que vulgarmente se chama responsabilidade social acrescida.
Ora, Helena Matos ao pretender comparar a SIDA, nos idos de 80, à actual COVID, para defender uma agenda política que é muito sua, comete, em meu entender, vários pecados indefensáveis:
- Confunde – e tenho de admitir que o faz deliberadamente, tal a monumentalidade do disparate – duas realidades cientificamente distintas, muito especialmente no que à relação entre seres humanos respeita e, portanto, à transmissibilidade da doença.
- Ignora, também deliberadamente, a dimensão comparada do impacto social entre ambas as maleitas… (Veja-se o exemplo da necessidade do teletrabalho: no que respeita à SIDA – e se me é permitida alguma ironia – apenas se justificaria em relação às equipas de produção de filmes pornográficos ou naqueles casos em que um ambiente de trabalho se revelasse muito promíscuo para além das tarefas do dia-a-dia, com vários «bodystorming» sobre as secretárias, maquinas de costura, etc…).
- Promove, concomitantemente, a desinformação num momento histórico em que o comum cidadão se debate no mar de informações contraditórias ou antagónicas que colocam em causa a sua própria sobrevivência.
Poder-se-ia continuar, mas não vale a pena. Helena Matos, como tantos «jornalistas» a que vamos tendo direito, não é tanto jornalista mas mais uma opinativista – o que, se calhar, até é um neologismo covidiano. Talvez por isso conceitos como a deontologia não se lhe aplicam nem há ordem profissional que a sustenha.
O bêbedo da aldeia não teceria melhor comentário, entre dois copos de três.
O Observador paga-lhe por isto ou para isto? É que até isso fará diferença…
Literatura e Cultura
em tempos de pandemia
Este o título da colectânea organizada e acabada de publicar pela UCCLA-União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, com o apoio da Câmara Municipal de Lisboa e com distribuição da Guerra e Paz , em que tive o gosto e a honra de participar, lado a lado com outros 74 autores, com dois poemas de minha autoria, articulados com a problemática pandémica que vivemos.
Brasil, Galiza-Espanha, Cabo Verde, Angola, Portugal, Moçambique, Olivença-Espanha, Guiné-Bissau, Macau, São Tomé e Príncipe, Goa e China, de todas estas paragens vieram as participações com que me apraz estar irmanado.

Respigo da Apresentação:
«A pandemia causada pelo vírus SARS-Covid-2 atingiu, de forma inesperada e dramática, toda a Humanidade, obrigando à adoção de planos de contingência, também adotados pelas cidades dos Países de Língua Oficial Portuguesa representados pela UCCLA, que determinaram constrangimentos de mobilidade e distanciamento.(…)
A UCCLA não podia, logo no início da pandemia, deixar de fazer um apelo à reflexão sobre o papel da cultura no combate à Covid-19.
Perante este flagelo, povos e países viram-se confrontados com novos desafios sociais e políticos sobre os quais importa refletir e encontrar novas respostas.
Daí que, neste contexto, a UCCLA fez um apelo dirigido aos homens e mulheres da Cultura, em especial aos escritores, desafiando-os a contribuir para essa reflexão.
O livro que agora se apresenta é o resultado desse nosso apelo.»
isto é que é qualidade de vida!
Houve um grande incêndio numa estação de tratamento de resíduos sólidos, em Trajouce, concelho de Cascais, no dia 10 de Julho de 2021.
Ver localização em:
https://www.google.com/…/data=!3m1!1e3!4m5!3m4!1s0x0…
O fogo foi considerado extinto por volta das 18 horas do mesmo dia… ainda que pela meia noite, 150 operacionais estivessem a combater as chamas.
A coluna de fumo espesso e escuro espalhou-se intensamente pelos concelhos de Cascais e de Oeiras.
Ouvi apenas uma tímida recomendação para que os habitantes de Oeiras e Cascais não saíssem de suas casas e, dentro delas, usassem máscara. Fora e dentro de casa, o cheiro extremamente desagradável e intenso, hoje, dia 11, pelas 10h45, continua a fazer-se sentir, intenso e incomodativo.
Estações de tratamento de resíduos urbanos em meio urbano, com grande parte dos produtos da recolha a céu aberto, onde os ventos dominantes espalham os eflúvios exactamente sobre as zonas mais densamente povoadas… não será de pensar, sei lá, que talvez esta localização e os respectivos equipamentos sejam de remodelar? Se calhar, até com urgência, digo eu. Creio que já o Mário Soares enquanto presidente da república disse isso mesmo aquando de uma visita às instalações… e já lá vão uns anitos, mais propriamente, em 1992).
Julgo ser oportuno acrescentar que o problema principal do mal de que vamos padecendo incide, especialmente, nas vias respiratórias. Além disso, o sol que se esperava para hoje, desapareceu.
O Serviço Municipal de Protecção Civil já disse alguma coisa?
Algumas imagens elucidativas, respectivamente de Rodrigo Antunes, Paulo Cunha/LUSA e LUSA:



um copo de água não se nega a ninguém.
Estou a pensar que isto de viver num concelho que ganhou a fama de ser o mais chique de Portugal – ainda se lembram do termo? – tem, no entanto e nos entrefolhos dos interesses instalados, muito que se lhe diga e nem tudo é abonatório do estatuto.
Seria longa e fastidiosa a conversa, por isso vou encurtar. Falemos de água ou, mais exactamente, da facturação das Águas de Cascais, S.A., que é uma daquelas empresas privadas vá lá a gente saber porquê.
Nem tecerei grandes comentários. Deixo apenas um extracto da última factura recebida. Consumo real, lido e facturado, correspondendo a 60 dias: 3 metros cúbicos. Valor a pagar 36,11 €.
Estou a pensar muito seriamente em fazer um contrato de abastecimento com uma empresa de água mineral.
A chatice é que, alegadamente, no interesse da saúde pública e pela letra da lei, sou obrigado a ter um contrato com as Águas de Cascais.
Por acaso ou por razões de mau feitio, uma legislação que me obriga a ter um contrato com uma empresa privada, sem concorrência, também é uma história para a qual ainda hei-de pedir a um entendido que me faça um desenho para perceber melhor o conceito, que isto da idade anda a tirar-me muito discernimento…
Deixo-vos, então, o tal extracto que é um tratado de fintas e malabarismos dignos de um Cirque du Soleil.

liberdade (sobre o tema de «A Lista de Schindler»)
Revisitando «A Lista de Schindler»
A oportunidade das coisas que fazemos é, quase sempre, muito própria e, geralmente, intransmissível. Este quase-poema foi escrito sob a influência do tema do filme, da autoria de John Williams, e das imagens sempre aterradoras de uma realidade que nos está próxima e, lamentavelmente, sempre muito presente: o menosprezo pela vida. Aqui vo-lo deixo:
LIBERDADE (SOBRE O TEMA A LISTA DE SCHINDLER)
quanto tempo há-de passar
oh quanto tempo
quanto rios hão-de secar
até cessarem de se inundar com as lágrimas
da miséria humana?
porque percorremos os bosques
do contentamento
os céus puros
e até as melancolias
dos amantes enternecidos
se mergulhamos depois as mãos no sangue
dos nossos irmãos
por uma fé iníqua
ou pela mera angústia de viver
pelo medo sem sentido
de ser?
a liberdade
flui em cada vida que brota
no eterno retorno da mesma vida
essa liberdade
entranhada no ser que somos
razão e matriz de vida e razão de ser
uno e um no meio dos outros
mas partilhado por tudo quanto de nós
se faz com o fluir do tempo
desse tempo por onde todos vamos perpassando
na ininterrupta caminhada
até chegar a hora
de passarmos o nosso testemunho e legado
ao mundo que nos acolheu
e a quem de tudo somos devedores
pelo meio do troar hediondo da guerra
e os gritos desgarrados do horror
a morte do nosso semelhante às nossas mãos
é a derradeira manifestação de aviltamento
e cobardia
é a negação maior da nossa própria existência
da nossa razão de viver
da nossa própria liberdade.
- Jorge Castro
20 de Junho de 2021
reflexões avulsas entre uma denúncia à embaixada russa e as expectativas do euro 2020, em 2021
Eu, por acaso, cada vez percebo menos de tudo, aproximando-me, a passadas largas, do estadio do só sei que nada sei.
Mas a cena da divulgação dos dados dos elementos alegadamente russos que organizaram uma manifestação legal, em Portugal, não será, entre muitas outras coisas, uma grosseira violação à legislação da protecção de dados?
Ah, pois, claro… a legislação só obriga os cidadãos. As instituições são superiores a essas minudências.
Dia 10 de Junho, ainda versejando a propósito:
tão grandioso e medonho
um Portugal adiado
que o Sol a meio eclipse
deu lugar e vez ao sonho
e em jeito de apocalipse
foi brilhar para outro lado…
Pedimos desculpa por esta interrupção da capacidade de raciocinar. Portugal segue dentro de momentos.
Atenção aos incautos: aproxima-se aí uma vaga de patrioteirismo futebolístico que pode causar danos cerebrais irreversíveis.
Tente manter o seu cérebro em actividade autónoma… nem que seja só durante os intervalos dos jogos.
Pequeno conto tão ficcionado que até parece verdade, mas não é:
Funcionário de uma câmara municipal em modo queixinhas e com problemas de afirmação:
«- Oh, sotor, aquele menino diz que o sotor anda a bater nos meninos…»
O pai do menino funcionário diz que se trata de uma atitude errada e, para castigo, vai nomeá-lo para um cargo qualquer de direcção de qualquer coisa. E o pimpolho acabou por ser nomeado director de turma.
Assim se reconhecem e punem os erros úteis, a bem desta e de outras «nações».
Litania ao Dia de Portugal 2021
venha lá a sardinha
as papas e os bolos
de enganar os tolos
a chuva miudinha
uva sem grainha
venha lá o medo
venham os bretões
nos seus aviões
dar cor ao enredo
em cor de lagosta
como a gente gosta
mas sem sinapismo
venham lá depressa
espantar o Eça
criar mais turismo
venha lá a Covid
que ninguém duvide
que está p’ra ficar
assim como estamos
entre desenganos
a olhar para o mar
venha a valentia
de num qualquer dia
ao mar nos fazermos
mas com a alegria
de um submarino
que só anda a remos
venha lá o vinho
o amigo e o vizinho
e do mal venha o menos
venham caracóis
com os futebóis
tão bons de rimar
tal como a cerveja
e a tanta inveja
que temos p’ra dar
ah meu Portugal
plastificado
como o via O’Neill
como o canta o fado
não há outro igual
…
ou melhor dizendo
não há outro Abril…?
- Jorge Castro
10 de Junho de 2021