Apesar das dificuldades da chamada «interioridade», a cidade, mormente no seu núcleo histórico, tem tido artes de se modernizar oferecendo aos locais e aos visitantes o conforto que o século XXI nos pode proporcionar.
Mesmo correndo o risco da polémica por eventual favorecimento, deixo-vos com uma imagem do interior do restaurante da Balbina, ponto de paragem para mim obrigatório, de há longos anos, e de onde saio sempre satisfeito.
A avó Balbina faleceu mas o seu neto João agarrou o testemunho e não deixou créditos por mãos alheias. Mantendo-se o exterior inalterado, o interior é outra conversa.
Não me «castiguem» por não referir outros espaços de restauração que ombreiam, também em qualidade gastronómica, com o que refiro. E são vários. Mas nem isto é uma agência de publicidade, nem o espaço e o tempo são ilimitados. De outros se falará a seu tempo.
Miranda do Douro (7)
Lá está… depois de uma alheira de Miranda, grelhada à lareira e acompanhada por uma simples mas primordial e fresquíssima salada, com o bom sabor dos velhos tempos, eis que dá entrada um cordeiro churro (canhono mirandês) que nos redime de quantos pecados carreguemos…
Aqui fica o brinde, à vossa saúde. E seguindo os ditames de Camões, «melhor é experimentá-lo que julgá-lo; mas julgue-o quem não pode experimentá-lo».
Miranda do Douro (8)
Nada como um passeio nocturno, para desmoer…
Miranda do Douro (9)
Pormenor do interior da concatedral.
Miranda do Douro (10)
Dir-se-ia que, entre o sagrado e o profano, venha o Demo e escolha. Assim sendo, para o bem e para o mal, há outros «ex-libris» que marcam presença em Miranda.
Deste, com interpretações várias, um dos cachorros da casa na Rua da Costanilha, todas elas serão danadas para a brincadeira… mas que lá estão, lá estão!
– O curador do rebanho, no caso, também conhecido como pastor.
– Tratado sobre a arte de bem cavalgar toda a sala (é mesmo sala, não foi engano…).
Na encerrada estação de Marvão-Beirã, uma família de cegonhas padece sob a canícula.
– Marvão.
– E, ainda, Marvão e o velho efeito do espelho.
– E, outra vez ainda, Marvão.
Uma nota: uma localidade sem cabos eléctricos a perturbarem a paisagem! A minha chapelada!
– Estação de comboio (abandonada) Marvão-Beirã.
Mais uma prova indesmentível de que somos um país rico e perdulário, onde nunca se atina com possíveis formas de rentabilizar, reutilizando, património edificado… antes que se desmorone.
Valha-nos, então, o foguetório e o festivalório, tão do agrado dos sacristãos do efémero, para irmos coçando todos estes eczemas (se quiserem, podem chamar-lhes dermatites atópicas, que dá um ar mais «apetudeite»).
– De volta a Castelo de Vide. À primeira vista, pareceu-me que a representação de Cristo se preparava para um solo de contrabaixo. Depois, vendo melhor…
Em Marvão, o restaurante-café O Castelo. Um bom sítio para estar.
Apreciei, especialmente, a vertente café. Já o «lounge» tive alguma dificuldade em perceber como desfrutar. O meu velho problema com as línguas estrangeiras…
É verdade que a paisagem é bonita e vê-se até muito «lounge», mas creio que a ideia não era essa…
Rumámos, depois, ao terceiro destino programado para este passeio: a cascata de Anços (ou cascata do Mourão).
Um cabo dos trabalhos para localizar placas indicativas, como é norma. Quando, finalmente e após muitas manobras em vias estreitíssimas, julgámos ter chegado a bom porto, estou convencido de que descobrimos, afinal, o caminho mais árduo e penoso para atingir o nosso destino.
Uma pequena chamada de atenção para os serviços das autarquias: já consideraram o potencial turístico – e refiro-me ao turismo interno – que estes pequenos recantos poderiam representar para o comércio local? E, de seguida, já pensaram que os cidadãos mais «antigos», aqueles que ainda tenham algum poder de compra, têm, por outro lado, aquelas maldades que a idade nos traz: articulações cansadas, capacidade pulmonar e cardíaca que já conheceram melhores dias, etc., etc.?
Se já pensaram nisso, porque é que oferecem estas pavorosas vias de acesso aos vossos lugares de encanto? Ainda por cima, sem uma ambulância do INEM ali à mão para as mais que prováveis ocorrências… Por acaso, o nosso grupo sentiu-lhe a falta, à força de um incidente ocorrido mas, como desenrascados que sempre somos, lá nos safámos.
Enfim, a cascata. Outro lugar magnífico. Ao contrário da água da cascata de Fervença, esta corria límpida. As cabeleiras de limos, saudáveis e viçosos, albergavam os habitantes do costume, rãs, sapos, e bicharada miúda que íamos divisando no correr da água.
Aqui e ali, ainda um saco de plástico que algum parvo-maior por lá deixou ficar, como depósito de lixo mas, ainda assim, sem grande impacto na paisagem.
Também deparámos com um cidadão, com um canzarrão monumental, que considerou que o melhor do seu esplendor cívico era entreter-se a atirar ramos de árvore para a lagoa que a cascata forma, a fim de que o animalzinho de estimação os fosse buscar. E foi, sim senhor, muito bem mandado e com grande estardalhaço e reboliço da tal água límpida que, assim, deixou momentaneamente de o ser.
Mas isso, como é bom de ver, não foi culpa da paisagem… Nem as rãs ou os sapos são seres muito dados a reivindicações de qualidade de vida e outras minudências.
(nota de rodapé – é extraordinária a quantidade de vezes que, nos dias que vão correndo e em espaços de utilização pública, tropeçamos com um qualquer cidadão agindo como se tivesse a presunção de que o mundo foi feito só para ele…)
Lapiás é um nome estranho. Habituei-me a espreitá-los de fugida na estrada que leva a Negrais, sempre que me assaltava uma vontade forte de degustar um belo leitão, naquela região de Sintra.
Como se pode ver no «doutor Google» e, nele, na «doutora Wikipédia», (https://pt.wikipedia.org/wiki/Lapi%C3%A1s) , lapiás ou lapiaz (palavra derivada de lapiaz, do dialeto da região do Jura) é uma formação típica de relevos cársticos, produzida pela dissolução superficial de rochas calcárias ou dolomíticas. Também pode ser causada pelos ciclos de congelamento e degelo em regiões de clima frio. Esclarecidos? Ora, ainda bem.
Em termos estéticos, acrescento que os lapiás de Sintra me transmitem uma sensação de irrealidade, de estar num outro mundo, que conheço apenas de efeitos cinematográficos… mas que ali não existem. É mesmo assim.
Desta vez, decidi então ir observar esta curiosidade natural mais de perto. Estacionei mal, pois não há local nenhum, nas imediações, que sirva para tal fim. Presumo que seja, também aqui, para preservar o ambiente…
O manto vegetal – riquíssimo e de grande beleza e diversidade – que cobre, actualmente, todo aquele espaço impede a visão de conjunto do aglomerado rochoso. Mas proporciona, por outro lado, uma sensação de aventura e descoberta, pois temos de nos embrenhar no mato para desvendar as formações rochosas. Não se perde interesse no passeio, por esse facto, pois dá-nos azo a ir descobrindo, a cada passo, o que a natureza tem para nos oferecer: flores variadíssimas, insectos, espécies arbustivas, trepadeiras, árvores diversas, de que destacaria o carvalho cerquinho.
Carvalho cerquinho que me proporcionou o ensejo de esclarecer alguns dos meus acompanhantes sobre a origem dos bugalhos, que víamos pendurados da galharia, a par das bolotas, essas sim o fruto daquela espécie arbórea. Já agora, aqui fica um esclarecimento:
Maria João Horta Parreira, da associação Plantar uma Árvore, explica o que são os bugalhos, para que servem e como distingui-los das bolotas.
Os bugalhos são galhas, isto é, multiplicações celulares que se formam nos órgãos das plantas como resposta à picada de insectos ou ao ataque de fungos, bactérias ou nemátodos. Assim, os bugalhos não são frutos, mas estruturas que as plantas produzem em resposta a agressões externas.https://www.wilder.pt/naturalistas/cinco-factos-curiosos-sobre-os-bugalhos/
Como informação complementar sobre este passeio, sempre vos digo que existe um percurso para caminheiros, devidamente assinalado, que é útil para não nos perdermos naquele «enredo vegetal», com trilhos perfeitamente visíveis e sem dificuldade.
Se a água do paraíso fosse acastanhada, turva e cheirasse a esgoto, se nela não existisse prova de vida que se visse, se o seu chão estivesse pejado de retraços ou desperdícios de mármore, se o seu acesso fosse – como porventura o imaginamos, ainda que por outros motivos – quase impraticável e de altíssimo risco, aquilo com que, ainda ontem, deparei na Cascata de Fervença (ou da Bajouca), em Sintra, seria um recanto do paraíso.
A estultícia do homem leva-o a dizer que esse recanto integra o «Parque Natural Sintra-Cascais», o que deixa esse mesmo homem e a sua acção muito mal colocados… ou até o próprio «Parque Natural», que se chamará assim para inglês ouvir, mas nunca para português usufruir.
Leio em https://visitsintra.travel/pt/visitar/miradouros-e-cascatas/cascata-da-fervenca, qualquer coisa de espectacular e promocional: «Esta cascata possui uma beleza deslumbrante, encontrando-se num recanto de acesso um pouco difícil e talvez por isso, seja tão encantadora, uma vez que se mantem no seu estado natural.»
Este «estado natural», com que a boa vontade de quem escreveu o texto nos surpreende, é composto por entulho, poluição e absoluta falta de manutenção de qualquer espécie no leito do ribeiro, com uma aparente exploração de pedreira, sobranceira à zona da cascata, a ajudar ao enredo.
O acesso viário, como tantas vezes acontece nestes recantos do Portugal infinito, destina-se, apenas, a iniciados. Placas sinalizadoras são inexistentes. Enquanto não se encontra um autóctone (que muitas vezes nem é português…) que indique a localização precisa do local, roça o impossível chegarmos a bom porto.
A ausência do canto das aves ou do coaxar das rãs contraria, entretanto, qualquer ideia de «estado natural»…
Cansa tanta maledicência mas, perante a beleza ainda restante do local, fica uma irreprimível sensação de desperdício e descaminho da «res publica». O município de Sintra não terá esta percepção?
Habituei-me a ver (e a disfrutar) essa bela mancha verde que se interpõe entre Carcavelos e a praia – onde se localiza o melhor e mais amplo areal da chamada Linha de Cascais – desde a minha vinda para estas paragens, em finais da década de 60 do século passado. Passeio entre amigos, em debates intensos mas discretos, ou com a namorada – onde o aconhego do arvoredo favorecia afectos não permitidos em circunstâncias normais…
Um ribeiro, árvores variadas e frondosas, carreiros criados pela habituação da passagem, fauna e flora que se refugia nestes últimos constrangidos redutos e que o ser humano ainda lhes disponibiliza. Enfim, um pequeno vislumbre do que a natureza tem para nos oferecer, mesmo se estamos a falar de um espaço criado pela mão do homem, mas no qual a tal natureza já imprimiu a sua identidade e supremacia.
Agora, este espaço está debaixo de fogo pela perspectiva de mais um gigantesco e megalómano projecto de urbanização, em que a parte destinada a zona verde tem vindo a ser progressivamente reduzida, até atingir os extraordinários 15% (…!…) actuais. Ou seja, umas fiadazitas de árvores entre os prédios gigantescos e gigantones a construir… apesar da opinião largamente maioritária da população.
Hoje, fui até lá para matar saudades, ver o estado actual – até para memória futura – e, desse passeio quero dar-vos notícia em imagens sem grandes palavras. Cá vão elas:
Digam-me lá: é de transformar tudo isto num amontoado de blocos habitacionais destinados a «aristocracias» ou «elites» de novo tipo que por aí pululam? Não seria de destinar este espaço ao usufruto da população onde, a haver espaços habitacionais, poderiam colher exemplo do que se vai fazendo, pelo mundo fora, e de acordo com os conceitos de sustentabilidade que tanto se apregoam mas que são tão «bombardeados»? Mais construção com tantos prédios ao abandono? Será este o reflexo prático mais adequado aos cuidados a ter com a preservação do ambiente?