Sendo este um  espaço de marés, a inconstância delas reflectirá a intranquilidade do mundo.
Ficar-nos-á este imperativo de respirar o ar em grandes golfadas.

vou fazer um poema

vou fazer um poema
que seja de ausência
de alguma plangência mais delicodoce
tentar construí-lo de fero granito
de urzes
de estevas
de manhãs geladas
um poema para variar de ser só amor
naquele dó maior de amante ou de amado

um poema com uivos
com brados e agravos
de espantar silêncios
de afiar machados
de rasgar os ventos até os mais bravos
de cravar as unhas em terra lavrada
tal fosse um arado
tal fosse uma espada
um poema que mate
um poema que morra
que também já cansa toda esta modorra
de tudo parado sem que ate ou desate
de fria masmorra

vou fazer um poema
que fale de gente
de gente nascida que parte para a vida
de cara lavada
um poema com lama
que salte da cama e grite na rua
o que lhe vai na alma
e que lhe sobre a calma de sentir no rosto
um raio de sol
um calor de Agosto

um poema pecado que traga no olhar
as vagas que o mar rebenta em arribas
a desfazer fragas com as brutas águas
diversas daquelas paradas
mortiças
a que tu me obrigas
quando me castigas com doces romances
meladas cantigas

e quando o poema por fim for nascido
levá-lo comigo
e mostrar ao mundo
que bem lá no fundo
o poema é então um poema de amor
desse amor maior e tão mais fecundo
que é ao mesmo tempo amante e amado
cruel e traído
temente e ousado
tão agreste quanto doce malmequer

afinal um poema como outro qualquer…

  • Jorge Castro
    09 de Dezembro de 2021

um pedido de Natal português

eu não quero
ó menino
que tragas no sapatinho
nem porcos de bicicleta
nem as vacas voadoras
cabritas das correrias
ou quilovátios de ricos
nem águas dos abastados
arreda-me os passadiços
estrafega os «halloweens»
pistas de gelo nem vê-los
ou aquaparques mui «ins»
de que já estou pelos cabelos
nem me tragas mais estufas
ou intensivo plantio
que nos chegam de pantufas
deixando o campo doentio

vem se queres de bicicleta
mas de andar em ciclovia
ou até de trotineta
sem atropelar asceta
coitado porque é velhinho
vem conforme a tua veneta
mas trilhando esse caminho
onde um bosque tem arbustos
e a floresta arvoredo
numa campina a papoila
é um grito no dourado
e um rosto de moçoila
fica melhor se corado
pelo sol e a brisa fresca
e num regato ir à pesca
do tempo desperdiçado

traz-me a hora vespertina
quiçá ao som de um nocturno
num pôr do sol ou ocaso
a que assisto por acaso
no verdor de uma colina
que já foi duna de areia
onde enraíza o passado
e no fulgor de uma ideia
brota ardente a flor presente
e o futuro ansiado
logo ali à minha frente

traz-me o que eu sou e o que é meu
não me tragas de ninguém
o que seja muito seu
como o colo da sua mãe
ou o cesto de um vintém
onde guarda a sua vida
e aguarda o que lá vem…

… que posso ser eu até
que podes ser tu também
já que a vida tem mais graça
quando se abraça outro alguém.

  • Jorge Castro
    07 de Dezembro de 2021

aquele homem, sim, era um poeta

aquele homem
sim
era um poeta

não se lhe sabe obra escrita
palavra dita ou ditada
mas decerto era um poeta
sofria espantos de luz num ocaso evanescente
e de tormentos de cor ao voo de mariposas
tinha frémitos de amor em primaveril campina
e o céu de tanto azul inundava-o de ternura
tal como um nascer do sol lhe dava melancolia
via universos nas nuvens que ninguém apercebia
e trajou luto cerrado ao pisar uma papoila

por fim foi crucificado
num pelourinho de injúrias
e à sua face serena lançaram pedras de escárnio
insultos só de arrogância

mas por entre a turbamulta que o ódio enegrecia
ele divisou um olhar de criança
que sorria
e morreu serenamente
como raro acontecia mesmo nos dias mais calmos
de tormentos pressentidos

aquele homem
sim
era um poeta
algo que ninguém sabia.

  • Jorge Castro
    29 de Novembro de 2021

das saudades…

Este poema tem como inspiração algo que li na página de Cristina Carvalho. Das saudades…


hoje eu senti saudades
coisa estranha de sentir
coisa que a razão contesta
mas que dizer dessa festa
de sentir e de sorrir
só por sentirmos saudades?

saudades
por reviver
algo que já foi vivido
nem é crime nem castigo
é tão-só um regresso
quem sabe
aquele recomeço
de algum momento incumprido
ou então por ter cumprido
um momento mais sentido

passo a vida a ter saudades
da hora em que fui nascido.

  • Jorge Castro
    26 de Novembro de 2021

o direito de ser

Por vezes pergunta-se porque nasce um poema… Tenho para mim que essa é uma questão quase irrespondível, tantas as respostas.
Hoje, entretanto, ouvindo notícias e assistindo a esse flagelo dos refugiados pelo mundo, deu-me para o soneto, não por catarse, mas por reflexão – porventura canhestra – sobre o ser humano.


O DIREITO DE SER
tentamos as palavras impossíveis
nesse tempo de miséria e de mágoa
e queremos ser aquela gota de água
vogando pelos mares imperecíveis

quantos ventos adversos infindáveis
e correntes tormentosas contra a proa
dessa nau de melindres sempre à toa
sendo as velas e o leme tão mutáveis

na certeza bem maior da vida incerta
mesmo contra a rigidez de cada muro
seja nossa a palavra assaz desperta

hausto grande de ar mais limpo e bem mais puro
porque a vida é sempre um grito de alerta
nós seguimos numa esperança de futuro.

  • Jorge Castro
    18 de Novembro de 2021

breves reflexões outubrinas
em ambiente feicebuque (III)

23 de Outubro

Reflexão matinal, ainda em pijama:
Quando leio e ouço que “os partidos de esquerda querem tudo para aprovar o orçamento” sinto-me preocupado é com a circunstância do povo português aparentemente não querer nada para aprovar o orçamento…

23 de Outubro

Aterrei acidentalmente naquela treta dos agricultores e das agricultoras de brincar da SIC e fiquei, subitamente, muito mais enriquecido. Então não é que uma das balzaquianas de serviço acaba de proferir a seguinte máxima: “toda a gente gosta de um deite”.
Ainda não faço bem ideia do que seja, mas sinto-me muito mais enriquecido.

24 de Outubro

Continuando as minhas perturbações linguísticas de quem, enfim, já tem alguma idade, hoje foi a vez de uma estudante de Coimbra me informar televisivamente de que estava com uma vaibe muito boa…
Está visto que preciso de me inscrever num curso para adultos.
Mas se até para o calão é preciso saber inglês, ainda não me decidi em que língua careço de actualização.

25 de Outubro

Em estudos alterosos nos quais me envolvo para atinar um pouco com o mundo à minha volta, concluí que houve, de facto, uma profunda mudança de paradigma:
Antigamente (e como é penoso o ar desta palavra) a meteorologia era determinante para os ciclos agrícolas e a qualificação de bom ou mau tempo prendia-se com a sua adequação aos interesses do lavrador no amanho da terra.
Agora, é diferente. A meteorologia é boa ou má consoante implica favorável ou desfavoravelmente com a nossa marcação de férias.
Parecendo que não, isto explicará muitas coisas…

25 de Outubro

Agora foi um técnico em aproveitamento de energia solar para iluminação que nos vem dizer que o peibeque é rápido…
Bem pesquisei no “pai dos burros” e não atinei com tal peibeque.
Fiquei com a ideia de que o senhor estaria a referir-se ao retorno do dinheiro investido. Mas não tenho a certeza, que estas coisas são muito complicadas.

breves reflexões outubrinas
em ambiente feicebuque (II)

21de Outubro

Eu, por acaso, cada vez percebo menos disto, o que me deixa à vontade para seguir a corrente e dizer uns disparates a armar ao analista político.
Vejamos: pelo aparente conteúdo do orçamento para 2022, o que é que impede que o PSD faça um acordo geringonçante com o PS, alcançando-se, assim, a almejada e consensual estabilidade do regime?
Pois, mas António Costa, numa lua cheia há uns largos mesitos, informou o povo de que acordos com o PSD, “jamé!”, que viria logo o governo ao chão e outras coisas assim catastróficas…
Jogada de mestre, esta, que deixou o BE e o PCP reféns desta salada. Se aprovam orçamentos perdem eleitores; se tiram o apoio ao governo perdem eleitores… Tudo a bem de um governo de “esquerda”, claro. E num caso ou noutro ainda têm a acusação de chantagistas em cima.
Nos entretantos, Costa ri-se, Rui desatina, a gasolina sobe a cumes incomensuráveis, a electricidade é o que se vê, os quadros da fiel depositária andam por aí, as “entidades reguladoras”, que nada regulam, pululam quais cogumelos, as negociatas miseráveis que se vêm fazendo de há uns bons 40 anos para cá não conhecem culpados nem remissão e Portugal vive com dois milhões de pobres, calma e tranquilamente…
Claro que esta descrição pode pecar por simplista e caricatural, mas há algum erro no raciocínio?
Façam lá uma pausa na telenovela e juntem os trapinhos, só para ver se podemos ficar um bocadinho mais felizes todos.

22 de Outubro

Quando ouço falar em “trabalho digno” sinto sempre um arrepio incómodo…
É que me lembro de que a minha companheira foi professora do ensino oficial durante 40 anos, mas nos primeiros 17 andou em bolandas com o estatuto oficial de professora “definitiva-provisória”.
Lembro, também, o esvaziamento avassalador de quadros na (grande) empresa onde trabalhei, substituídos por trabalhadores no malfadado “outsourcing”, alguns dos quais mantêm ainda esse estatuto há mais de vinte anos.
Lembro a passividade cúmplice dos sindicatos para quem – e inúmeras vezes o ouvi – a desregulamentação do mercado do trabalho era uma “inevitabilidade”… quando deviam lutar por se tratar, isso sim, de uma ilegalidade.
Lembro o atropelo, também ilegal, dos contratos colectivos de trabalho, obrigando as novas admissões à aceitação de contratos individuais com o pagamento de salários inferiores a metade do que auferiam os abrangidos pelos contratos colectivos.
Lembro-me dessas realidades vividas e muitas mais do mesmo quilate… e quando ouço, agora, falar no trabalho digno corro a munir-me de uma toalha de banho para não me encharcar de lágrimas de crocodilo.

22 de Outubro

Esta ideia nasce de uma conversa com um familiar próximo que me é muito caro e assim aqui ficam os créditos que lhe são devidos.
Mas nasce, também, porque me deu na cabeça fazer um teste de ADN. E escusam de estar para aí com palpitações, que eu não vou revelar minudências nenhumas acerca das minhas origens, que isso é muito coisa minha.
Mas informo, muito humildemente, todos os meus amigos que, se alguém se quiser referir à minha pessoa, com alguma exactidão quanto à ascendência genética, o mais correcto é chamarem-me mestiço.
Está combinado? Obrigado.
(Curiosamente, depois desta alteração, hoje acordei exactamente igual a ontem…)

breves reflexões outubrinas
em ambiente feicebuque

14 de Outubro

Dá que pensar… Em La Palma, cães que foram abandonados pela retirada precipitada dos donos estão a ser alimentados por drones. É bonito e humanitário.
E quantos drones estarão disponíveis para alimentar, por esse mundo fora, os seres humanos que foram abandonados por outros seres humanos?
Na verdade, vivemos num mundo cão e não num mundo humano, o que talvez explique disparidades destas.

15 de Outubro

Ouvido nos noticiários de hoje: os preços da electricidade no “mercado regulado” que, conforme tem vindo a ser exaustivamente anunciado, iam aumentar inevitavelmente e muito provavelmente já em Outubro, afinal vão baixar, de acordo com informações oficiais.
Fui eu que ouvi mal? O Pai Natal enganou-se no calendário? Ou trata-se das negociações para aprovação do orçamento a fazerem-se ouvir?
Ah, e os combustíveis, onde o governo informou, anteontem, de que não poderia diminuir impostos, afinal vai diminuir o ISP, conforme anunciou hoje?
Não é preciso repetir as perguntas acima formuladas, pois não?
A propósito, alguém sabe dizer-me onde se localiza a Disneylândia, em solo nacional? Ando a precisar de me distrair… Obrigado.

15 de Outubro

Por acaso, as Ciências nunca foram o meu forte, mas fonte de encantamento…
Li, recentemente – atrasado que eu ando nestas coisas – que já há viaturas movidas a hidrogénio, comercializadas de há uns anitos para cá. Da altitude das minhas ignorâncias, li e reli, e decidi que vou já adquirir uma viatura destas. Nem que tenha de vender a casa e os anéis, pois aquilo não só não polui como purifica o ambiente. Uma comodidade ainda por cima boa para o mundo? É uma verdadeira causa filantrópica!
De repente, informaram-me – um amigo fiel, que os há – que não existe, em Portugal, um único local onde abastecer a maravilha da modernidade.
Vocês nem queiram saber como estou para aqui a deprimir-me…

15 de Outubro
Agora, sim, a saúde, em Portugal, vai dar aquele salto quântico que nos irá transportar a algum Nirvana até ver ignoto. E basta comprar um telemóvel…
(De um anúncio perto de si.)
Já ter a gasolina mais barata, só porque comprei uma lata de salsichas e uma pizza congelada, me fazia alguma confusão…
E imaginar que tudo isto começou com a oferta de uma semana de férias em Tróia na compra de um colchão. Como o tempo passa…

16 de Outubro

Eu não sei se isto também se passa convosco mas, a mim, acontece-me muito…
Passeando no feicebuque, leio uma entrada cheia de humor e de saudável espírito criativo de algum amigo destas andanças. Leio, saboreio, divirto-me. Depois, dá-me para ler alguns comentários sobre essa entrada que li, saboreei e me divertiu.
Mas há alguns desses comentários que são tão estúpidos, tão desprovidos de sentido em relação ao que ficou dito, enfim, tão desajustados, que acabam por destruir o efeito saudável que o autor me transmitira.
Para quando um algoritmo profiláctico contra a estupidez?

20 de Outubro

Foi só por amor que o Estado português entregou os quadros milionários a quem lhe jurou fidelidade.
Fidelidade, essa manifestação etérea do ser mas nem sempre do estar…
Porque, afinal, ela jurara já fidelidade ao outro, até que a morte ou um divórcio com partilha de bens os separasse, o que, até ver, não ocorreu.
O Estado, agora e já tarde, tem uma atitude de ciúme extremo ao saber da existência do “outro” e exige à sua pretensa fiel depositária que lhe devolva os quadros e, quem sabe, as cartas trocadas ao longo destes anos e algumas faianças lá de casa, herança de uma velha avozinha…
Se tudo isto não fosse uma realidade pungente, poderia ser o argumento de uma novela pindérica e de quadragésima quinta categoria. Afinal, é só o dia a dia cá do burgo.

Pico – Açores – Setembro de 2021 – A saga (fotográfica) – III

Na Reserva Florestal de Recreio da Prainha (São Roque do Pico) pode fazer-se um passeio aprazível por entre vegetação muito variada. Nela se encontra esta casa típica do Pico.
E para que não se cuide que, entre tantas maravilhas, deixei por lá perdido o meu sentido crítico, veja-se este exemplo de um poste tão estrategicamente colocado em frente a um miradouro, situado na Reserva Florestal de Recreio da Prainha.
Nem o horizonte seria a mesma coisa sem ele…
Como se não bastasse a profusão de hortências que propiciam um ambiente tão peculiar a todas as ilhas dos Açores, ainda fui encontrar variedades da planta. No caso e salvo erro, estamos em presença da hortência coroa (ou coroa da rainha).
Visita guiada à Gruta das Torres. Esta gruta é de origem vulcânica e é o maior túnel lávico do arquipélago dos Açores.
Fica a uma altitude de 285 metros e possui cerca de 5 quilómetros de comprimento e uma altura máxima de 15 metros. Possui um túnel principal de grande dimensão e vários túneis menores de estruturas variadas na parte superior e laterais.
Um apontamento: acompanhou-nos um guia excelente, senhor de um humor notável. Escapou-me o nome, mas aqui fica a referência mais do que merecida
No interior da Gruta das Torres, estalactites formadas pelo arrefecimento da lava.
No solo da gruta, outra curiosa formação criada pelo deslizamento da lava.
Nas «paredes» da gruta outra formação curiosa que parece ter sido feita por mão humana.
No chão da gruta, uma «formação» que não deixa, também de ser curiosa: garrafas cheias de vinho do Pico, em maturação, aproveitando as condições muito específicas do interior da gruta.
(Não, lamentavelmente, não está disponível para visitantes…)
Ainda uma formação curiosa no chão de lava da Gruta das Torres. A esta chamam-lhe a «cabeça da baleia», o que parece razoavelmente apropriado.
Gruta das Torres – Já a esta chamarem-lhe «Mona Lisa» requer o seu quê de imaginação criativa.
Gruta das Torres – o ponto final da nossa intrusão na gruta e da visita guiada. Daqui para a frente só especialistas, existindo até vários trechos bastante «constrangidos».
Gruta das Torres – o fim da saga dentro da saga. De regresso à superfície, após uma hora e picos em absoluta escuridão, apenas rompida pela luz das lanternas individuais, não deixa de nos proporcionar um muito discreto suspiro de alívio…
As célebres e, no caso, celebradas cracas. Não foi fácil chegar a elas mas com a boa vontade do restaurante da Ponta da Ilha e encomenda prévia, travei conhecimento com mais um delicioso pitéu!
O Farol da Ponta da Ilha.
Mais um ser autóctone que nos veio cumprimentar.
A ponta da Ponta da Ilha. Ao fundo, São Jorge e muito, muito mar…
E as plantinhas de um verde vibrante a colonizarem, passo a passo, o chão de lava.
Na Casa dos Vulcões, em São Roque do Pico, uma janela sobre a ilha.
No ancoradouro da Madalena, a caminho de um almoço e a fazer horas para o regresso, com o Faial em fundo.
O avião do regresso. Bom serviço da SATA, como apontamento final.
Mas, com tanta magnificência tão portuguesa, porquê, meus senhores, «Azores» por tudo quanto é sítio? Os turistas não usam, lá por casa, o C cedilhado? Temos pena. Deixem-se de parolices, ó senhores mandantes, tende vergonha na cara e vaidade no que é nosso… e que o Pico tão bem representa!
De uma assentada, desvirtua-se o Português e enterra-se o legítimo orgulho. Fica só a subserviência.
O derradeiro aceno do Pico que, bom companheiro, se guardou para nós, com o seu cabelo de nuvens, no final desta «saga».

Um destino magnífico. Visitem-no, se puderem… mas não levem pressa. Estas coisas degustam-se melhor devagar e com os sentidos todos bem despertos.

Pico – Açores – Setembro de 2021 – A saga (fotográfica) – II

Publico esta imagem não tanto pelos seus atributos fotográficos, mas como tributo a uma realidade da Ilha do Pico que muito me agradou:
Por toda a ilha deparamos com piscinas mais ou menos naturais, verdadeiros aquários onde pululam peixes vários, e cuja qualidade da água, a qualidade das infraestruturas de apoio – todas gratuitas -, como chuveiros, sanitários, cadeiras, sombras, etc., não podia deixar de assinalar.
Ah, a propósito, a da imagem, uma daquelas em que até é mais visível a intervenção humana e que se situa para os lados da Piedade, estava com a água a 23º… e eram já 19 horas locais.
O nascer do sol na Ribeirinha.
Apontamento fotográfico complementar: imagem obtida ainda deitado na cama… (Ah, aqueles malditos cabos que atravessam tudo quanto é paisagem e até perturbam o direito à preguiça…!)
Porto das Lages do Pico – um dos locais de onde partem as embarcações para observação de cetáceos, como é o caso documentado na imagem.
Umas águas-furtadas nas Lages do Pico, recurso arquitectónico em que esta povoação é pródiga, com particularidades muito curiosas.
Sim, também há gatos no Pico e onde vi os melhores exemplares foi nas Lajes do Pico. Este esteve quase a meter conversa, mas acabou por não dar confiança…
A Ermida de São Pedro (1460) é um templo religioso católico localizado na povoação das Lajes do Pico.
Este pequeno templo, com origem na ordem franciscana, é a mais antiga construção religiosa do concelho das Lajes e da ilha do Pico, tendo sido erguido, conforme a tradição oral indica, pelos primeiros povoadores no local onde desembarcaram.
Teve como primeiro pároco, não só da ermida, mas da própria ilha, Frei Pedro Gigante, que é considerado pelos historiadores como tendo sido o introdutor da casta Verdelho no Pico. Bem aventurado, pois, por ter dado atenção, também, às coisas terrenas…
Também nas Lajes do Pico, o Museu dos Baleeiros. Imperdível.
Na sua loja podemos encontrar diversos livros que documentam a faina dos baleeiros, uma verdadeira gesta de sobrevivência para os ilhéus.
Um exemplo, entre muitíssimos, da tradicional e magnífica arte de gravação em ossos ou dentes de cachalote, onde podemos observar imagens de um realismo impressionante.
(Uma pequena nota para os coleccionadores do «politicamente correcto»: a caça aos cetáceos, nos Açores – que, aliás, cessou pelos idos de 80 – , não tem nada a ver com a caça industrial que se fez – e ainda faz – um pouco por todo o mundo. Ali tratava-se, de facto, de economia de sobrevivência e as condições pavorosas em que se efectuava recomendam algum respeitoso comedimento antes de se proferirem apreciações apriorísticas).
No porto das Lajes do Pico, o repouso entre fainas
No Museu dos Baleeiros, cópia de uma foto que documenta os trabalhos da lavoura que complementava a faina da pesca.
Lagoa do Caiado, na freguesia de São Roque. O deslumbramento da paisagem.
Nem só de vacas felizes se poderá falar, passeando pelas altitudes da ilha.
A uma altitude superior a mil metros, ruminando na paisagem, entre neblinas e horizontes impossíveis… Ainda assim, com um interessante toque decorativo na cornamenta.
Lagoa da Rosada, quase-quase a desaparecer por trás da neblina, que chega sem avisar e pode durar tempos infindos. Em meio minuto, vejo-te… e já não te vejo!
Caixa de correio na Ribeirinha – Peculiar reutilização.
No Pico, omnipresença flanqueando as estradas, a beladona (Amaryllis belladonna) assume aqui o pitoresco e carinhoso nome de «meninas que vão à escola» (com algumas variantes, diga-se).
Florescem em Setembro e «caminhando» ao longo dos caminhos são, na verdade, como meninas que se dirigem à sua escola…
Ribeirinha – O labor discreto, portas adentro.
Ribeirinha – A sua igreja, elemento omnipresente em qualquer das povoações, e o canal por onde corre a ribeira, mormente nas grandes chuvadas.
(Nota – para os puristas, lamento, mas não resisti a «varrer» da imagem tudo quanto eram cabos eléctricos, a perturbar a paisagem.)
Ainda na Ribeirinha, o interior da marcenaria onde se formaram muitos dos marceneiros que ainda existem na ilha, conforme nos informou um senhor que, passando por nós, nos facultou uma bela lição de História da povoação… e, no final, apresentando-se como professor de História aposentado, ainda nos pediu desculpa pelo tempo e conhecimentos com que nos brindou.
(A fotografia foi obtida através de uma vidraça muito manchada pelas agruras do tempo…)
Um vitelo curioso com os processos de industrialização.
Todas as coisas têm o seu mistério
e a poesia
é o mistério de todas as coisas
– Federico García Lorca

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