Hoje, em período natalício tão celebrado em toda a parte deste nosso mundo ocidental, não me apetece colocar a imagem de nenhum presépio.
A imagem que hoje selecciono é a que documenta a inadjectivável acção policial que ocorreu no Martim Moniz (Lisboa): algumas dezenas de transeuntes, porventura de nacionalidades várias, obrigados a colocarem-se de braços levantados contra uma parede durante mais de uma hora para serem revistados por agentes da PSP!!!
Vergonha e humilhação! E tu, gostarias de te ver nestes preparos, ou aos teus filhos ou aos teus netos nos diversos países para onde nos exportamos diariamente e de há tantos anos para cá?
As «explicações» dadas pelos actuais mandantes deste país para esta atitude, digna de tempos hitlerianos nos guetos judeus, são tão manhosas quanto idiotas, frustres, cobardes e sem sentido.
Parece que, no resultado da gigantesca operação policial, foram efectudas duas detenções (pelo menos, uma delas a um cidadão português), apreendido algum dinheiro, alguma droga e algumas armas brancas… também conhecidas como canivetes. Talvez se a região seleccionada fosse, por exemplo, a Quinta da Marinha, em Cascais, ou numa sexta-feira no Bairro Alto ou no Cais do Sodré os resultados fossem mais avantajados…
E é assim. É Natal! Paz na Terra aos homens de boa vontade… Mas, em boa verdade vos digo, irmãos: fascismo, nunca mais! Pelo menos, é o que se deseja intensamente mas, tal como as bruxas, que os há, há e cada vez se atrevem mais a sair das sombras pestilentas onde chafurdam.
Montenegro, Ventura e Moedas, a mesma luta, não é…?
À entrada da Anta Grande do Zambujeiro, em Valverde (Évora) a artificiosa natureza esculpiu, servindo-se de um sobreiro, o símbolo totémico de um dragão. Nada de futebóis, bem entendido. O dragão ou a serpente alada, em tempos ancestrais, seria uma marca identitária do território onde hoje vivemos. Podem espreitar em https://pt.wikipedia.org/wiki/Ofi%C3%BAssa Pois é… tanta coisa que por aqui nasceu e nós sabemos tão pouco…
Nos dias que vão correndo, em que se adensam velhas querelas e se dão grandes passos no sentido de um conflito mundial generalizado pelas sempiternas vontades hegemónicas de uns poucos sobre as vidas de tantos outros, sob o manto pouco diáfano das múltiplas religiões, apeteceu-me relembrar aqui o sonhador John Lennon e o seu tema «Imagine», sempre oportuno, sempre actual.
Esta tradução é de minha responsabilidade, sem especiais preocupações de retroversão poética, porque o importante é a mensagem transmitida, que é para ser entendida muito para além de ser apenas cantarolada.
Imagine não haver paraíso Imagine there’s no heaven É fácil se você tentar It’s easy if you try Nenhum inferno por baixo de nós No hell below us E por cima somente o céu Above us, only sky
Imagine todas as pessoas Imagine all the people Vivendo para o dia de hoje Livin’ for today
Imagine não haver países Imagine there’s no countries Não é difícil fazê-lo It isn’t hard to do Nada por que matar ou morrer Nothing to kill or die for E também nenhuma religião And no religion, too
Imagine todas as pessoas Imagine all the people Vivendo a vida em paz Livin’ life in peace
Você pode dizer que eu sou um sonhador You may say I’m a dreamer Mas eu não sou o único But I’m not the only one Espero que um dia se junte a nós I hope someday you’ll join us E o mundo será um só And the world will be as one
Imagine não haver possessões Imagine no possessions Pergunto-me se será capaz I wonder if you can Não haver necessidade de ganância ou fome No need for greed or hunger Uma irmandade do homem A brotherhood of man
Imagine todas as pessoas Imagine all the people Partilhando todo o mundo Sharing all the world
Você pode dizer que eu sou um sonhador You may say I’m a dreamer Mas eu não sou o único But I’m not the only one Espero que um dia se junte a nós I hope someday you’ll join us E o mundo viverá como um só And the world will live as one
Em 2012, a Câmara do Porto aceitou a doação da estátua “Amores de Camilo”. Essa doação foi aprovada pelo Executivo Municipal, motivo que impede que seja retirada (felizmente…).
«que terão eles visto na estátua que eu não vi nem viste tu? perturba-os a senhora nua ou o Camilo não estar nu?» – isto vai dizendo o Eça à Verdade que ele enlaça…
ah houvera quem vos dera no vosso alvar frontispício mesmo em retórico exercício senhores donos do pudor com um bronze ou um granito que vos esculpisse algum grito sem vos causar mal maior mas recentrando a esfera da cabeça… se a tivéreis
não sabeis vós que a nudez afinal foi quem vos fez? ou será que a vossa afronta vem de algo de pouca monta que sem força não ergueis – falo eu do argumentário que de frustre e passadista mais soa a reaccionário com presunção moralista
«olhai bem para o que eu digo não cuideis de quanto eu faço» diz o abade ao abrigo de seus filhos no regaço… não sejais tais sacripantas sacristas ou até eunucos tudo em redor conspurcando com seus aleivosos mucos
não frequentais vós as praias oh cruzados da moral? não vos perturbam as belas com tanto fio dental? que mostra mais do que esconde quanto na mulher avonde e é de si primordial?
deixai-vos lá dessas tretas ou armados em ascetas proibireis o areal?
No dia em que se celebram os 100 anos do nascimento de Natália Correia quero aqui destacar dois aspectos que considero primordiais na sua vida e na sua obra: o inconformismo militante e a irreverência permanente.
Natália diz-nos, também, que o poeta deve ter uma intervenção política e, se olharmos atentamente, não foram raros os casos entre a plêiade de excelentes poetas portugueses do nosso século XX cuja intervenção na «res publica» foi o pilar maior do seu destaque, a par da sua mestria, e por isso se mantêm como referências duradouras.
Natália, seguramente, mas também Pessoa, O’Neill, Gomes Ferreira, Aleixo, Saramago, Mourão-Ferreira, Ary, até Cesário, entre tantos outros mais.
Pensemos, pois, nisso e que extraia cada um as suas ilacções.
E como, por vezes, ser ibérico não será pecado, Gabriel Celaya, cantado por Paco Ibañez, já nos dizia:
«(…) Maldigo la poesía concebida como un lujo
cultural por los neutrales
que, lavándose las manos, se desentienden y evaden(…)»
Leio, com frequência, a crítica nas redes sociais de que há, por aqui, gente que não se enxerga e opina sobre tudo como se de tudo fosse entendido.
Creio que esta crítica merece alguma ponderação. Opinar sobre tudo não trará mal ao mundo enquanto não pretendermos, ao emitir uma opinião, obrigar os outros a segui-la.
Se, por outro lado, emitirmos uma opinião errada ou errónea que seja contraditada por alguém que saiba mais e melhor sobre esse assunto, ou por melhor acesso a informação ou por maior domínio de conhecimento, o contributo desse alguém será precioso para um melhor esclarecimento do primeiro emissor.
Pessoalmente, já fui inúmeras vezes corrigido por bons amigos que muito prezo e tanto mais pela sua frontalidade. Isso não me impede de, em cada passo da jornada, estar atento ao mundo que me rodeia, muito pelo contrário. De Paulo Marques, professor, com a devida vénia, respigo a resposta de Ramalho Ortigão aos seus críticos que o acusavam de falar de tudo sem, verdadeiramente, aprofundar nada:
“O meu grande mal é não me interessar especialmente por uma coisa só, qualquer que ela seja, porque me interesso completamente e absolutamente por tudo. A indigente multiplicidade dos meus pontos de vista inabilita-me para o especialismo.»
Também o romano Públio Terêncio Afro terá proferido a frase, adoptada por Marx como lema, segundo a qual “sou homem e nada do que é humano me é estranho”.
Por outro lado, muitas vezes a crítica a uma opinião alegadamente superficial é, na verdade, sustentada por uma arrogância intelectual de quem, pretensamente, muito sabe, mas guarda esse saber no bolso interior do casaco, para que não lho roubem… Ainda que haja, por aí, muitos carteiristas do saber e do conhecimento.