100 Noites com Poemas
o livro-álbum no seu lançamento
na Feira Medieval de São Domingos de Rana

Decorreu, no passado dia 09 de Abril de 2017 e integrando as festividades
 da Freguesia de São Domingos de Rana, na sua Feira Medieval, 
a sessão de lançamento do livro-álbum 100 Noites com Poemas, com edição da Apenas Livros
Esta obra, que integra o descritivo das 100 sessões realizadas entre 2005 e 2014, bem como as biografias dos incontáveis convidados que as ilustraram, é composta também por um conjunto de poemas originais, da autoria do chamado «núcleo duro» desta iniciativa, e ainda um acervo de várias centenas de imagens recolhidas em cada sessão.

Foi tornada possível a sua publicação graças à prestimosa colaboração e apoio com que contámos por parte da presidente da Junta de Freguesia de São Domingos de Rana, Dra. Maria Fernanda Gonçalves, que aqui vemos enaltecendo a qualidade gráfica e de conteúdos da obra em apresentação…

… e que disponibilizou, também, o espaço para o lançamento do livro, em recinto «acastelado» integrador da Feira Medieval que então decorria, e que aqui vemos na abertura da sessão e na apologia da obra já nascida. 

O Professor José d’Encarnação, amigo certo e  companheiro de tantas andanças deste projecto – como de incontáveis outros… – honrou-nos com a sua costumeira ilustração… 

… dando ainda mais brilho ao que ele apelida, no seu prefácio, como «contratorpedeiro» cultural.

Conciso e, ainda assim, repleto de saberes foi o seu discurso… 

… perante um recinto que se encheu até aos limites do possível…

… uma vez mais deixando-me com o penhor de gratidão por tão interessadas amizades que, incansavelmente, me deslumbram sempre no momento de dizer «presente!».

Depois, os agradecimentos com tendência para infinito, o que decorre da multidão de envolvimentos, de cumplicidades, de afectos com que sempre contei (e contámos!) ao longo desses nove anos de actividade em redor de um projecto poético.

E disse, por fim, um dos poemas constantes do livro-álbum.
Quis, com ele, homenagear, também, quantos – presentes e ausentes – ombrearam comigo, ao longo desses nove anos, construindo a par e passo, esse… deslumbramento.  Destaco:
– Alexandre Calmeiro e Castro
– Ana T. Freitas
– Carlos Peres Feio
– David Silva
– Eduardo Martins
– Estefânia Estevens
– Francisco José Lampreia
– João Baptista Coelho
-Lídia Castro
– Lourdes Calmeiro
Maria Francília Pinheiro
… e quantos mais se nomeiam ao longo do livro.
Com tantos contei muito.
Maria Fernanda Gonçalves encerra a efeméride…

… ao que se seguiu uma prolongada sessão de autógrafos, como é da praxe e, apesar dos pesares, nos sabe sempre bem. 

Como apontamento final, uma fotografia de grupo com vários responsáveis da iniciativa Um Poema na Vila, de Coruche, companheiros de sempre que, se souberam inspirar-se nas Noites com Poemas, souberam demais ganhar as asas próprias para voos que já contam com cinco anos de actividade em prol da Poesia. Venham mais cinco…!
Uma referência, ainda, ao apoio dado pela
  EMACO – Espaço e Memória Associação Cultural de Oeiras
apoio esse que também se revelou imprescindível para a concretização deste livro-álbum e com a qual contaremos para uma nova apresentação, desta feita no Templo da Poesia do Parque dos Poetas (Oeiras) e que terá lugar no próximo dia 26 de Maio, pelas 21 horas .  
– Fotografias de Lourdes Calmeiro

dia de poesia

é dia de poesia
que alegre bizarria
e que bizarra alegria
saltam poemas à liça
saltam poetas à beça
assim mesmo
cedilhados
sendo mais que muitos mil
e são de todos os lados
uns mais dados
outros não
– que ele há-os arredados
e outros mal comportados…
de norte a sul
tão fecundos
que são até fecundados
de tão sérios
ou jucundos
por mistérios tão profundos
como outros mais arredios
fugidios
embuçados
ou então delicodoces
de sabor a rebuçados
de mentol
são mentolados
ou então mentalizados
o certo é que neste dia
vai alegre a alegria
com poemas
mais de mil 
sempre em et coetra e tal…
neste mundo qual mosaico
que – vai a ver-se –
é prosaico
um tal dia de poesia…

– Jorge Castro
21 de Março de 2017

Camões e a calçada portuguesa

Só para não dizerem que não falei em flores… dar-vos ei razão e falarei de outra coisa qualquer. Que o quotidiano está aí, anda à nossa volta e não há arte maior do que lhe dar olhos de ver.

pisoteia ela a calçada
alto o salto
esbelta a perna
e o salto alto penetra
no canal lacrimejal
de quem foi grande poeta
mas jamais acidental
que ocidental era a meta

a ranhura que era fina
finória e sem ter largura
deu de si – perdeu a sina
e cresceu em desmesura
por tanto
e tanta mais treta
o salto alto penetra
naquele olho do poeta

e o artista ligeiro
corre e salta pressuroso
p’ra não dizer altaneiro
actualizando o ficheiro
que parece insidioso
assim de olho esburacado

com martelo e martelada
tira e põe pedra a preceito
aconchega e põe a jeito
o sem-jeito da calçada

e quase sem dar por nada
pedra a pedra martelada
espanto que já nem cala
varrido que é o restolho
ali nasce em quase-nada
no poeta sobre um olho
o negrume de uma pala… 

– Jorge Castro

o menino de Alepo

O menino de Alepo

– igual a todos os meninos do mundo todo onde a nossa irracionalidade
conflitual perante a Vida
tanto perturba o nosso entendimento sobre essa mesma
Vida

tenho cinco anos
num espaço de tempo do tamanho do mundo
chamo-me Omran
e brinco no pátio em frente da casa
e o meu riso alegre
alegra o meu pátio
porque tenho cinco anos
e nem sei bem qual é o tamanho do mundo

mas sei o tamanho de um sonho que invento
e me brilha no olhar

tenho cinco anos
e o sangue palpita-me pelas veias fora
com a intensidade da luz

tenho cinco anos
e o mundo fragmenta-se
em dor
morte e ruínas
sobre o meu tempo do tamanho do mundo

tenho cinco anos
e cada estilhaço que me rasga o corpo
que rasga as janelas da minha casa toda
que rasga os meus pais e os meus irmãos
que rasga o meu riso
e enterra a alegria tão fundo
tão fundo
mais longe que o mundo
tece em meu redor um muro de morte
onde um silêncio espesso
impede que o Sol penetre a poeira
que vem dos destroços
sem ver cor de esperança
de uma outra maneira

tenho cinco anos
e já tão sem tempo

só tenho o meu nome
perdido o olhar…
– Jorge Castro

um Verão assim…

Já todos sabem (ou sabemos) que um poema não serve para coisa nenhuma. E, ainda assim, se escreve um poema…

há um arco negro de cinzas
a invadir-nos o chão
e um cerco de vozes-tardas
a ensombrecer a razão
mas um sol sempre a nascer
no negro de solidão
como asas brancas voando
emigrantes porque sim
porque é assim que são brancas
por ser assim que lá vão
cruzando os céus de negrumes
até ser azul-Verão
que é um azul mais profundo
do que alguma outra razão

mas não há lamento algum
que possa cobrir o manto
de tanta cinza no chão
de onde nos brota a vida
e onde se perde a razão

mas lá vão as asas brancas
a mostrar-nos porque sim
porque voar de asa branca
entre tanto e tanto não.


– Jorge Castro