há um horizonte rasgado em chamas

– Em 2017 morreram mais de cem pessoas, em Portugal,
devido aos incêndios

há um horizonte rasgado em chamas
e um chão lavrado em lágrimas
há um clarão de noite falsa
e uma escuridão que o Sol não abre

há este torpor
esta modorra
de não saber porque se morra
assim
sem pressentir um alguém
que nos socorra

há este sangue a jorrar de forma inútil
em tons de cinza
e tanta angústia
há um pavor de fugir por ter de ser
e um terror só por ficar
e assim morrer

e cada árvore endémica
ou estrangeira
lança a estridência da seiva ardida
contra as nossas consciências permissivas
desatentas
e aborrecidas
com tanta ardência
num céu que se imaginara azul…

– Jorge Castro
17 de Outubro de 2017

há quanto tempo não publico um poema
quando tudo se incendeia…

Nem terra nem céu

nem terra nem céu
apenas cinza
só as pedras ardem sem rescaldo ou luto
e o chão estremece
sem sangue nem fruto

e o céu é de breu
do negro martírio
da brasa que foi
o mais tenro lírio
no homem crepita a vil labareda
que ateia o terror
em estreita vereda

e outro homem arde
em nexo de horror
nalgum fim de tarde

nem terra nem céu
apenas cinza

… e o homem sou eu!

– Jorge Castro
10 de Outubro de 2017

101ª sessão das Noites com Poemas
com a EMACO, no Templo da Poesia do Parque dos Poetas, em Oeiras

E foi já em 26 de Maio – que o tempo voa!…
Talvez a sua denominação traga em si alguma pompa, mas a circunstância relevou o facto de estarmos no Templo da Poesia, ainda que sem adequados paramentos que não fossem os dos afectos e da partilha, expressões recorrentes nesta nossa iniciativa em prol da Poesia.
– fotografia  obtida em www.elevogroup.comptportfoliotemplo-da-poesia
 Templo da Poesia Parque dos Poetas – Oeiras – visão nocturna



Em actividade agora integrada nas iniciativas da 
EMACO – Espaço e Memória – Associação Cultural de Oeiras
propomo-nos dar continuidade às Noites com Poemas, usando para esta 101ª sessão, como pretexto – se tal fosse necessário – uma nova apresentação do livro-álbum 100 Noites com Poemas.  



Em belíssimas e confortáveis instalações e agora sob a égide da Câmara Municipal de Oeiras…

… nesta nossa sessão muito condignamente representada por Eduarda Oliveira, responsável pela Divisão de Cultura e Turismo e nossa anfitriã, ensaiámos, pois, esta acção que se quer projectada para o futuro.  

Joaquim Boiça, enquanto presidente da EMACO deu as boas-vindas aos presentes, anunciando sucintamente os objectivos  da Associação e várias das iniciativas que levamos em curso. 

– De seguida, o Professor José d’Encarnação, de algum modo já considerado o afectuoso padrinho desta iniciativa, brindou-nos com uma muito original e pessoalíssima abordagem às nossas sessões, que, para nosso gáudio, vem acompanhando desde a primeira hora, o que lhe confere autoridade para a ela se referir de cátedra e, como ficou bem patente para todos, com um cunho de originalidade, até, que nos emocionou.   

Depois, o anúncio – que a mim me competiu – das duas rondas de poemas com que o «núcleo duro» brindaria os presentes, referindo, de passagem, alguns aspectos mais relevantes deste encontro de amizades que conta já com mais de dez anos de idade e sem esmorecimentos.
Talvez tão-só por recear que algum futuro (previsível) possa desvirtuar-nos o passado, neste mundo de fogos fátuos e do culto «assanhado» de irrelevâncias e de foguetório, onde nos cumpre afirmar, no presente e na primeira pessoa, que – como sempre nos diz José Fanha –  somos portugueses aqui, sem delegar em mandantes das tais irrelevâncias um testemunho que a nós nos compete.

Ana T. Freitas

– Carlos Peres Feio

– David Silva

– Eduardo Martins

– Francisco José Lampreia

– João Baptista Coelho

– Luís Perdigão

Fernanda Frazão, figura tutelar das Noites com Poemas, que sempre acompanhou e apoiou, das mais variadas formas e modos, que a fazem transcender, para cada um de nós, o mero estatuto de editora, para aquele outro de amiga, companheira, conselheira e cúmplice, ajudando a compor este ramalhete de navegações que, de outro modo, muito difícil seria de conduzir a bom porto.

E, por fim, Jorge Castro – o próprio… – cumprindo a sua parte na ronda de poemas e anunciando o encerramento da sessão…

… não sem que antes desse a voz a Idália Silva, elemento integrante do grupo congénere ao nosso – um poema na vila – especialista em nos brindar com «poemas de circunstância» que têm invariavelmente o condão de constituírem um momento de bom humor e disposição, ditos com uma graça… enfim, que é muito dela e que muito nos apraz, para além de nos ter composto, ainda, o «primeiro poema de Oeiras» para esta sessão! 

O público, numa sala muito bem composta desde a primeira hora, e sem o qual grande parte da relevância do que escrevemos e dizemos se desvanece, esvaziado de interesse maior, pois nesta arte de promover mensagens, se o e o emissor não contar com o destinatário… estamos conversados.
Em nome da única integrante destas 100 sessões que constituíram o nosso livro-álbum, Maria Francília Pinheiro, que não mais nos acompanhará em próximas sessões mas cuja memória não deixará de nos acompanhar sempre, foi dito um seu poema, constante do livro e que por ela nos foi legado:
Maria Francília Pinheiro
(30/01/1934 –
20/04/2013)
Faz-te ao largo
Depois da ventania me levanto
Como o bambu em pleno canavial.
O choro aprendi a afogar e o pranto,
Lembrando dizeres de velho ancestral:
É tempo de arribar
do teu quebranto.
Vê como é belo o
espaço sideral!
Cuida a ternura, a
graça e o encanto
Dos pombos que
namoram no pombal…
O medo de ter medo
é que destrói.
Lava as feridas.
Não te importes se dói.
E faz-te ao largo
em estrada não andada…
Procura a força.
Está dentro de ti.
Mas nada importa.
Olha o mundo e ri, 
Que o Sol traz amanhã
outra alvorada!…
 Maria Francília Pinheiro,
in Poesia Que a Mágoa Tece, Lisboa,
2007)

– fotografias de Lourdes Calmeiro e de Lídia Castro

Sugestão:
100 Noites com Poemas em Coruche

Pela mão da infatigável Ana Freitas e com a colaboração dos nossos amigos de Coruche, haverá uma nova apresentação deste nosso livro-álbum, no próximo domingo, dia 11 de Junho, pelas 15 horas, no Auditório José Labaredas do Museu Municipal de Coruche.
Apareçam! Vendo bem, até Coruche é um salto de pardal e o tempo é sempre bem empregue!

25 de Abril de 2017

Ainda e sempre outro Abril
Aqui Posto de Comando do
Movimento das Forças Armadas.
As Forças Armadas
Portuguesas apelam para todos os habitantes da cidade de Lisboa no sentido de…
encherem a cidade de esperança
de semearem de cravos vermelhos um tempo de nova esperança
de criarem a corrente rumorosa a inundar sete colinas
até se cumprir num Tejo em arco-íris de esperança
de serem tempo sem tempo
mas um tempo de mudança
de criarem novos mundos
de serem a contra-dança contra o dançar sem esperança
de serem tempos de gente além do que a vista alcança
a darem passos de gente
que na vida se agiganta
sem terem medo da vida
sem terem medo da esperança…
Aqui Posto de Comando do
Movimento das Forças Armadas…
assim cumprimos Abril
olhando de frente a esperança
rubro Tejo
mar de anil
de um tempo sempre em mudança.
– Jorge Castro

04 de Abril de 2017