Continuo com grandes dúvidas quanto à necessidade de um poema… Mas o que é certo é que lá vou tropeçando em palavras que se juntam sem pedir licença. Desta vez, por diversão feicebuquiana (com a Rosário Freitas) dei por mim agricultor… e surgiu isto:

POEMA PARA O DIA DE AMANHÃ

certo dia plantei uma metáfora
no húmus de vaga ideia
que sem saber me aflorara
adubei-a a réstias de inspiração
e protegia-a de agruras de ventos crus
ou de fera maresia

quando vi que enraizara
enxertei-lhe um soneto lento
de rima cadenciada
a meia altura da base
até um ponto incerto
algures entre o desconhecimento
e coisa nenhuma
só para ver se florescia

cerquei-a de vivências torpes
de mal-queridas verdades
de atropelos e más sortes
mas também de três sorrisos
um de papoila
outro estrela
e outro de ouvir o mar
onde o tempo esmorecia

e quando chegou Abril
já muitos anos depois
de um tempo de clausura
vi a aventura crescer
direita ao céu
perturbante
em cada folha uma pena
em cada fruto um poema
e Abril acontecia.

– Jorge Castro
em tempos de covid19, de 16 de Abril de 2020