Já todos sabem (ou sabemos) que um poema não serve para coisa nenhuma. E, ainda assim, se escreve um poema…

há um arco negro de cinzas
a invadir-nos o chão
e um cerco de vozes-tardas
a ensombrecer a razão
mas um sol sempre a nascer
no negro de solidão
como asas brancas voando
emigrantes porque sim
porque é assim que são brancas
por ser assim que lá vão
cruzando os céus de negrumes
até ser azul-Verão
que é um azul mais profundo
do que alguma outra razão

mas não há lamento algum
que possa cobrir o manto
de tanta cinza no chão
de onde nos brota a vida
e onde se perde a razão

mas lá vão as asas brancas
a mostrar-nos porque sim
porque voar de asa branca
entre tanto e tanto não.


– Jorge Castro