Com Eduardo Salavisa e os seus cadernos de viagens, com João Seixas dando corpo às imagens com as palavras – aqui de pleno direito – de circunstância, com os poemas trazidos às mãos cheias por todos nós… apenas me restava dizer que a sessão decorreu magnificamente.

Mas Miguel Brito, também presente, dicidiu dissertar sobre o que o evento lhe suscitou, com o texto-relato, sentido e vivido, que me fez chegar e que vos deixo:

Resumo da sessão – Breves apontamentos

de Miguel Brito

Um caderno é uma boa companhia. Grande ou pequeno, tem a vantagem de fornecer companhia, sobretudo quando se viaja sozinho, o que aumenta a disponibilidade da pessoa, disponível para ver o que se nos oferece, e o dia a dia pode ser uma viagem, que começa no quotidiano.

Cada desenho é o registo de uma memória, faz lembrar um tema, e espaço, e tempo de vida. Desenhar é permitir rever a vida, um registo biográfico de acontecimentos. São recordações intensas, porque quando desenhamos são desenhos no exterior, momentos fugazes que exigem atenção de todos os sentidos, e plasmam o tempo acontecido.

Cadernos que servem para tudo e para nada, às vezes podendo passar a livro. Desenhar em viagem é como viver o lugar, fazer parte da comunidade, participar visualmente nos acontecimentos pelo desenho. Transformar o quotidiano em viagem é pôr a vida numa perspectiva diferente, ganhando uma visão abrangente.

O maior problema do desenho é exigir tempo, e por isso é mais complexo de gerir em viagem de grupo, por eventual divergências de interesses. Um caderno é um laboratório portátil, tem privacidade e é transportável. Permite experimentar técnicas simples. Desenho rapidamente a caneta e pinto em casa. Os desenhos do dia a dia não se fazem, vão-se fazendo.

Escrever também é desenhar, é desenhar as letras e as ideias com palavras. Cada desenho é um deslumbramento de ideias. Temos que olhar para o quotidiano e ver os lugares em nós.

Pensar a cidade como um ser vivo. Precisamos de nos deslumbrar com a envolvente, descobrir na rotina o momento de liberdade. Precisamos de viajar, no sentido de liberdade em meros momentos do quotidiano, em que precisamos de descobrir a nobreza e excepcionalidade no quotidiano e nos simples e pequenos lugares que povoam a nossa vivência diária.

Património visual é e deve ser tudo, o suporte de comunicação entre tudo, em que a cidade activa todas as componentes culturais. Desenhar tudo é essencial para a nossa recomposição do mundo, para determinar a rede de suporte da nossa integridade mental, reinventar e contar a história dos dias, intensificando o viver e o sentir.

Desenhar tudo é essencial para perceber o que vemos e o que vivemos. Estamos num mundo visual fragmentado, e é importante descobrir o caminho da singularidade pessoal, vivência de interpretação de cada um. Conhecer e interrogar a cidade é pensar-se sobre si próprio. Lisboa hoje não é uma cidade, é uma região, uma vasta área de influência, lógica centrífuga e de eterno movimento, desdobramento e reflexos. Desenhar é viver a esperança em relação aos nossos quotidianos. O ser humano é urbano, é tecer conexos entre todos, formar sociedade.

Desenhar é mostrar vivências, de quotidianos assimilados. Ao desenhar aprende-se a ver, e a aprender a ver, aprende-se a estar desperto e estimulado pela curiosidade ao que nos rodeia. Poder passear pela proximidade, com um novo olhar, permite a liberdade de reinventar e ganhar riqueza no valor do quotidiano, valorar os dias, ganhar sentido de vida.

Desenhar é contribuir para dar olhares sobre os lugares, os acontecimentos, os instantes, e em suma, a vida.

Reinventar uma leitura, perceber como o olhar forma uma imagem, e como as imagens marcam a vida e a caracterizam. Desenha ré iluminar a cidade com uma nova luz, com uma cor de vida que nos define o olhar. A prender a desenhar é aprender a viver de outro modo, é aprender novas perspectivas e aprender novas visões.

“Lisboa é uma cidade em tom de fado” (João Baptista Coelho)
Pode representar-se o real? Apenas suposições, apenas visões. Apenas tudo, apenas nada, apenas vida.
Como podem observar, enquanto decorreu a sessão, Eduardo Salavisa foi registando os seus apontamentos gráficos, enquanto João Seixas ia, também, preenchendo uma folha de papel de intensos apontamentos. Espero poder contar com uns e outros para os divulgar cá pelo Sete Mares, um destes dias.
No final, os nossos convidados recebem o certificado emitido pela Vereação da Cultura de Cascais – de que sou mero portador – assinado pela senhora vereadora Dra. Ana Clara Justino, com o agradecimento e o justo destaque  por mais uma belíssima sessão de que foram primeiros protagonistas.
– fotografias de Lourdes Calmeiro –