Irei hoje concluir o brevíssimo resumo deste
Passeio das Mouras, em que participei, entre os dias 2 e 5 de Outubro, por terras de Lamego, Tabuaço e Castro Daire.
Ainda no dia 4, caía a tarde, e a poucos quilómetros de Castro Daire decidimos, em boa hora, fazer um desvio do caminho principal para um destino não programado, mas cujo nome nos suscitou curiosidade: Moura Morta.Mal chegados e tivemos pronta confirmação da boa escolha feita. Regressados a uma viagem no tempo, dir-se-ia, ao passar pelo vetusto de construções e empedrado, em que o forte e omnipresente odor a estrume de gado, antes mesmo de tropeçarmos com ser humano vivente, nos dizia estarmos ainda numa comunidade viva.
Pelos demais companheiros de jornada não posso falar, mas, quanto a mim me respeita, dir-vos-ei que tudo se conjugava para me transportar às minhas memórias primordiais, passadas em terras transmontanas dos avós maternos.
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Do inusitado da denominação da terra nos falou, em forma de história em verso, a D. Célia Matias, a quem fomos levados por uma embaixada de mocinhas dos seus dez anitos, outra prova da vitalidade da terra…
Talvez a mera intenção de efeito decorativo não o tivesse pensado, mas a mim pareceu-me estar ali um verdadeiro ex-libris da povoação, que nos saudava mal entrámos em Moura Morta…
… Depois, alguns dos responsáveis pelo olor que cobria a povoação entraram em cena, à hora do regresso das pastagens, bamboleando a sua pachorrenta mas determinada caminhada, mil vezes calcorreada, a causar apreensão aos citadinos.
Nem a suave beleza da pelagem fazia esquecer a cornamenta, que parecia atravessar a estreitíssima estrada, de lado a lado…
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Dia 5, já próxmos do termo do passeio, foi o momento de visitar o Mosteiro de Santa Maria de Cárquere.
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Ali por onde vagueiam lendas de D. Afonso Henriques, fomos espreitar, por detrás do altar-mor, a pedra sobre a qual teria ocorrido o milagre que lhe curou as pernas e salvou o reinado, mandando a boa-fé acreditar que assim teria nascido Portugal, ainda que a prudência aconselhe outros aprofundamentos e estudos que permitam casar a lenda com a realidade, tanto quanto o correr dos séculos o permita.
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No segundo altar da nave principal, um misterioso segredo:
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– o altar móvel esconde uma série de pinturas murais, das quais não logrei apurar a origem.
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Como habitualmente, quem sabia partilhava o seu saber com os demais, em enriquecedoras palestras de circunstância, que deram outro tempero à viagem.
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Aproximava-se o remate da aventura. Apeteceu-me colocar aqui, quase como corolário do passeio, a
Menina Sol, pintura da nossa companheira de viagem, Aline Daka…
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… que veio do Brasil para ser recebida pelas magníficas cores outonais com que os nossos campos se vestem.
Porventura, por estas e por outras, a nossa proverbial fama de hospitaleiros…
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Eu dei por mim a jogar ao Jogo do Galo, lançando caruma de pinheiro e bolotas sobre o velho granito da escadaria perto do Mosteiro, pois a cada um a sua arte própria de buscar o segredo das coisas…
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… como a Fernanda Frazão nos parece mostrar, sob o olhar aquiescente da Manuela.
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Havíamos, ainda de seguir para o Mezio, para uma lauta e tradicional refeição de feijoada de chouriço.
Mas, de algum modo, ficou ali, junto ao Mosteiro de Santa Maria de Cárquere, escrito o encerramento do Passeio das Mouras, reflectido o céu no tanque onde repousavam as flutuantes folhas do Outono, num toque de melancolia que rima bem com estas circunstâncias.
À nossa anfitriã, Maria Estela Guedes (ver TRIPLOV), os nossos agradecimentos por este transporte ao mundo real dos sonhos. Haveria que muito esmiuçar para revelar uma falha na organização e que, afinal, apenas serviria para lhe realçar o brilho de todo o enredo.