dia 3 de Outubro – Por Lamego, contámos os minutos para cumprir projectos: bairro do castelo, castelo, catedral e museu…


Pelo caminho, um relance ao Teatro Ribeiro Conceição onde, na noite anterior, decorreu o Filo-Café.

Já nos clautros da Sé Catedral de Lamego. Fundada em 1129, este monumento gótico ostenta sinais bem visíveis das modificações que foram sendo introduzidas, nomeadamente nos sécs. XVI e XVIII, de onde destacaria o claustro renascentista.

Curiosamente, verificámos que, muito ao contrário de muitas vozes, pelo menos por Lamego há uma ideia precisa de qual seja o sexo dos anjos…

… do mesmo modo que apreciámos, nos frisos da porta principal que, na Idade Média, nem tudo era tristeza ou obscurantismo e que, mesmo em lugar sagrado – ou talvez por isso mesmo… – havia boas razões para a vida ser vivida.

Da sua grandeza e monumentalidade estamos conversados. E quem não conhece, já sabe onde fica.

Ah, e ali numa ruinha , do lado direito, a uns cinquenta metros, chega-se a uma casa onde nos podemos (e pudemos!) abastecer com a afamada bola de carne de Lamego.

Pela mão da Estela Guedes e numa aprazível esplanada defronte da Catedral fizemos as honras devidas à bola, por entre conversaduras e desconversas…
Faltava-nos, claro está, a inevitável romagem ao Santuário de Nossa Senhora dos Remédios que, recomendou o bom senso e alguma lassidão do corpo, que iniciássemos a visita pelo cimo da escadaria.

Por concepção de Nasoni, a sua construção inicia-se no séc XVIII e termina já com o século XX adiantado.

Deslumbrei-me com dois ancestrais e monumentais castanheiros que ficam no largo lateral ao santuário, um já morto, mas a que as heras conferem um simulacro de vida; o outro pujante, ainda, mas ambos distintos representantes dessa árvore sacra, culto de antigos e pasmo de novos…

«Levantou-se então o Arcebispo de Braga e pondo a Corôa na cabeça a El Rei disse: Bendito seja o senhor Deos, que sempre me ajudou, quando vos livrava de nossos inimigos com esta espada que sustento para vossa defesa» – Primeiras Cortes de Portugal


De novo por bandas do século XII, a visita à Igreja de Almacave, onde se diz que poderão ter tido lugar as primeiras cortes, em Portugal. Da sua antiguidade não restam dúvidas, apesar dos incidentes vários de que foi vítima. Pinho Leal afirma mesmo ter sido a Sé dos Suevos e Godos, até 716, sendo uma Mesquita moura, até 1102.

Desta ocupação lhe advirá o nome estranho e de incógnita procedência.

À noite, de regresso a Britiande e após uma lauta refeição de cabrito assado, fomos escutar, na Casa do Povo, uma palestra de Fernanda Frazão e Gabriela Morais sobre as mouras, o seu significado e interligações com a História de Portugal. Sobre o nosso papel nessa História que vem do fundo dos tempos, a contar-se por largas dezenas de milhares de anos… e o papel dos bardos nesse passar dos anos.

Claro que a sessão foi rematada com poesia, a que se seguiu um passeio nocturno pela povoação.

dia 4 – Em direcção a Tabuaço, pelos caminhos do Pinhão.

O espelho de água do Douro duplica o comboio que nos acompanhou na viagem…

Há quantos anos ando para fazer aquele passeio de comboio ao longo do rio…! Uma verdadeira provocação, tendo por cenário a paisagem única onde a mão do homem moldou cada palmo de terra em seu proveito, pelo seu suor.
Em Tabuaço, uma imponente araucária saudou-nos… E ela só, pois o Turismo, em pleno dia de Domingo, estava encerrado, como em tantas localidades País fora.

Por lá íamos, munirmo-nos de bases documentais para um dos próximos destinos, a Granja do Tedo com a sua muito peculiar história da Maria Coroada.

Mas a porta do Turismo e os nossos narizes foram os únicos a encontrarem-se.
Rezam lendas que dois irmãos cavaleiros, D. Tedon e D. Rausendo, a terão erigido, lá pelos séculos X ou XI. Mais rezam que a moura Ardinga se perdeu de amores por D. Tedon – mesmo sem o conhecer, que os tempos propiciavam os amores platónicos e desesperados – coisa que o senhor seu pai. o emir de Lamego, não teria apreciado sobremaneira, tendo degolado, ali mesmo, a desventurada apaixonada…

Malhas que a história tece e entretece.

Certa é a sua disposição, de costas para o rio Távora e tendo a porta principal e frente – a um metro escasso – de um penhasco, o que nos leva a pensar quão estranhos podem ser os desígnios da razão.

Por certa, também, me fica a ideia de que uma vida inteira não chegaria para lobrigarmos o quanto temos de património riquíssimo na sua ancestralidade, nas histórias, contos ou lendas que o envolvem em teias de mistério e de encantamento, que são, afinal, aquilo de que a nossa alma deve ser feita – embora tantos de nós, lamentavelmente, o não saibamos.

Alguém falou de que ali, perto da Ermida, haveria uma praia fluvial.
Outro alguém repousou dos árduos caminhos em banco natural, predisposto a arengar às massas de tal palanque… não o tendo encontrado tanto de feição à descida.
A praia fluvial é esplêndida e verdadeiro corolário da lenda da moura Andringa, fazendo-lhe jus com o seu espelho de água onde as escarpas reflectidas assemelhavam o portal para um outro mundo, que Tedons, mouras e emires povoarão, ainda, se o ousarmos cruzar.

Para remate deste capítulo, as durezas de castanho e dourado, a guardar o trecho de água, a roubar-nos a vontade de dali sair…