O fim de semana foi um pleno de actividades. E porque a minha ausência por este espaço onde tenho cruzado caminhos com tão excelente gente já me obriga a algumas explicações, cá deixo alguns orgulhos, a título exemplificativo, o que poderá ser levado, porventura, à guisa de feira de vaidades, mas onde asseguro o dispêndio de algum suor e sangue pela fruição da coisa poética.

1. 04 de Abril – Fui convidado pelo Movimento Escola Pública para participar com alguns poemas numa acção de rua, na Rua Garrett, em Lisboa, de sensibilização da população para a importância de um ensino público, digno e empenhado. Entre outros, levei este cântico de zurzimento…

se uma ministra funesta
defenestra a Educação
que raio de festa é esta
só de peste e disfunção?

bate o pai
a mãe
o filho
no professor
pois então
que a dar-lhe sova e enxovalho
fica o país a retalho
a golpes de pica e malho
mas de canudo na mão

(vede
o quanto a ministra briga
puxa à docência o cabelo
p’ra ter rebanho cordato
neste sucesso a martelo!…)

avalia
desobriga
reuniões faz a eito
entre actas de entreactos
partes gagas
malas artes
sai dali mestre perfeito

não que ensine
nem que eduque
faça o pino ou arme em duque
o mestre que a Milu quer
aprende tão só o truque
de dar volta que amaluque
a arte de dar saber

e a criança patega
de pais bem mais que coitados
se vê no horizonte a nega
leva pai e mãe
criados
amigos e outros malvados
na bordoada ao docente
fica a ministra contente
e os secretários babados

fez a Milu um entrudo
em matéria de canudo
com saldos para tanta gente
que filho p’ra ser um lente
– tal como o quer esta gente –
não é crise complicada
hoje é coisa de um repente
e amanhã…
já nem é nada

mal vamos se assim ficarmos
já Pitágoras o dos catetos
avisava quem o ouvia
– e alguns eram seus netos… –
se a criança educarmos
com saberes que a vida dá
e de que a todos enformem
precisão não haverá
de vir a punir o homem.

2. 05 de Abril – Depois, pelas Caldas da Rainha, na Biblioteca Municipal, a convite da Comunidade de Leitores das Caldas da Rainha, nas pessoas de Palmira e Carlos Gaspar, na Comemoração (ainda) do Dia Mundial da Poesia e em homenagem ao poeta Ruy Belo, acompanhado por Isabel Sá Lopes, António Ferreira, Henrique Fialho – um companheiro dos blogs!… – Teresa Belo e a participação de Ruben Leiria (clarinete) e Luisa Yakovenco (piano), da Academia Musical de Óbidos, houve mais poesia…

A Ruy Belo

um poeta é um consolo
e nem é de justapô-lo
ao Sol ou a algum cometa
um poeta é o que é
juntando letra após letra
até à luz da utopia

mas é feito dessa carne
que a uns e outros irmane
decorrendo o dia-a-dia

muda de rumo e de meta
muda o mundo e et coetra
e de tal não se enfastia

tem de tudo a vizinhança
do olhar de uma criança
ao chão duro em que confia

um poeta é um desvelo
– «melhor é experimentá-lo» –
já um poeta dizia

não vá alguém duvidá-lo
experimente então sabê-lo
começando pelo Ruy Belo…
3. 06 de Abril – Ars Integrata, no Palácio Foz, em Lisboa. Por entre dourados medalhões, seráficos querubins e muita música, um salão a rebentar de gente pelas costuras, acolheu-nos. David Zink, o Coro Corelis, com o Maestro Victor Roque Amaro, Júlia Lello e eu, demos o nosso melhor para que a tarde ainda mais se dourasse…

Canção de embalar

Vês?
Se tu quiseres eu sou capaz de voar
Depois peço que me dês a tua mão
E virás comigo a todos os céus dos jardins por inventar
Veremos tudo o que fica para aquém dos nossos sonhos
E as pétalas das flores que nunca serão espezinhadas

Porque nós os dois sabemos bem desse mundo sem tempo e sem lugar
Desse espaço apenas apercebido na hora indecisa da madrugada
Em que os ogres adormecem e voltam a ser meninos
E as fadas cansadas demais para existirem
Se recolhem confundidas com as árvores da floresta

Haveremos de percorrer uma a uma cada estrela
Principalmente aquelas que ainda nunca vimos
E que guardam em si a luz que trazes no olhar
Estaremos na fúria dos mares e dos ventos
Seremos tão pequenos que ninguém saberá de nós
Tão imensos que caberá em nós todo o universo
E o nosso riso perturbará no firmamento a Via Láctea

Vês, filho
Como é tão grande e cheio de tudo este espaço em que podemos voar?

Voemos
Voemos agora que já vestiste o teu fato espacial da nave do sono
E eu me retiro devagarinho para não te acordar…

– poemas de Jorge Castro

No próximo dia 09 de Abril, irei encontrar-me com Manuel Freire e outros, em Setúbal, homenageando Adriano. E ainda Abril vai no adro!…

Todos estes convites – que muito me honram – padecem, no geral e entretanto, desse mal nacional que é a falta de qualquer tipo de recursos, para serem levados à prática. O amor à camisola é uma expressão que adquire outros contornos, porventura mais suados do que em outras modalidades, quando se envereda por estes caminhos.
Assim é que nada disto é pouco, nem muito. Apenas a tentativa de descobrir quanta razão é que a minha avó tinha quando me dizia que quem corre por gosto não cansa…