Tendo José Jorge Letria como convidado, lá nos encontrámos, uma vez mais, numa revigorante sessão de poemas e de conversas em volta deles, na Biblioteca Municipal de São Domingos de Rana. Decerto não ficámos a saber a resposta à questão colocada mas, com a notável ajuda do nosso convidado, todos nos sentimos mais próximos do portão de entrada para aceder a essa aventura.

Deixo aqui o poema de minha autoria que me acompanhou nesta sessão:

porquê um poema
quando tudo vem das mãos
nesse arado pena-espada de teimar em semear?

será das penas de ser
ou tão apenas de estar?
ou é o leito de penas onde repousa o destino?

um poema é um imperfeito
um jeito meio sem jeito que surge em olhar felino
um jingar de andar varino numa candura de amar

mas é vento no sobredo
percorre campos de medo em cenas de velho enredo
que não deixam de crescer

nuvem de grossa procela
enchendo de prenhe a vela no incerto do apuro
da nau sem leme que somos

um poema não tem donos – é o pão do que não temos
voo apontado ao futuro
do caminhar que sonhamos

é uma agreste elegância
rosa de espinho acerado ferindo de bela o grito
colhendo em sangue a fragrância

um poema faz-se mito
de tanto o quanto acredito entre azuis de céu e mar
sem ter longe nem distância

é uma esfera armilar
onde os anéis que nos guiam se limitam no infinito
de um qualquer navegar.

– poema de Jorge Castro