… pois ninguém me tira da cabeça que a vitória do professor Cavaco constitui, como venho dizendo de há uns tempos a esta parte, o resultado eleitoral mais favorável ao engenheiro Sócrates.
Aí teremos por vários anos a “estabilidade” tão cara a esta gente, que lhes vai permitir singrar no mar da pasmaceira em que todos nos vamos afogando, tão cheios de amarras, quando não de âncoras, que nos atrofiam enquanto pessoas e enquanto povo.
Sócrates e o seu séquito fizeram de tudo, durante o próprio decurso da campanha, para denegrir aquilo que se poderia chamar, algo eufemisticamente, o “sentir de esquerda”. Desde as pseudo-hesitações da campanha, até às mais impopulares medidas tomadas nas últimas semanas, tudo valeu para descredibilizar qualquer “projecto de esquerda”, abrindo caminho ao “redentor e salvador da pátria”.
Estranho, mas significativo, que nem Sócrates nem Soares tenham dedicado uma única palavra aos demais candidatos, para além do professor Cavaco. Significativo e sintomático.
Numa última pantominice revanchista, o senhor engenheiro até decidiu botar faladura em cima das declarações de Manuel Alegre. Um chiste! Um triste! Um traste!
Aos senhores analistas políticos de serviço que, sem excepção, vitoriam Cavaco há meses, gostaria de perguntar – a esses tão fiéis seguidores da doutrina das sondagens, uma fé de novo tipo – se não consideram que o seu bajular indecoroso constituiu o mais reles exercício anti-democrático pelos intuitos claros de condicionamento das opiniões.
Na verdade, ao ouvi-los fica-se, até, com a sensação de que já nem se justifica o trabalho de ir votar. Bastam as sondagens! Elas e só elas lhes determinam e capacitam o poder de análise. Ainda assim, dos 72% “garantidos” de votos no professor Cavaco, em campanha despudorada de há poucas semanas, desaguaram nuns rasantes 50% e uns trocos. E nenhum dá a cara para emendar a mão. Para quê? Já tudo passou… Um asco! Uma pulhice! Uma putice!
Por fim, os 20,7% dos votos efectivamente colhidos por Manuel Alegre mostram, numa análise assumidamente simplista, que há 1.000.000 de portugueses (ou, melhor, para cima de 1.120.000) fartos desta trampa toda e cheios de vontade de mudar o estado de coisas.
Esses, a que nada me custa juntar os votos nas candidaturas de Jerónimo de Sousa e de Francisco Louçã e, até, de Garcia Pereira, são o grande capital de esperança que me permitirá encarar o dia de amanhã como mais um dia de combate pela vida.
Como mais um dia em que esse combate faz sentido.