certo dia num sobredo uma bolota traquinas
danadinha p’rò folguedo entre as bolotas meninas
por força de caganita que um melro depositara
ao volejar sobre a dita bolota que se agitara
deu por si num alvoroço caindo desamparada
lá do alto da galhada no toutiço de um moço
que dengoso ali passava
e o moço mal encarado
– que ao humor nunca fiava –
pô-lo a bolota assustado no imprevisto da queda
descuidada no pexote
fica o mancebo danado com a mancha sem Quixote
e na pança o fidalgote leva um Sancho ataviado

assustado e vingativo
suja a camisa de seda
borrado o seu porte altivo
ali jurou o magano mal chegasse a executivo
cumprir um rijo plano contra o sobreiro inimigo

e que plano era esse que tal cabeça albergou?
ora desse por onde desse
de serra em punho e machado
malas-artes que inventou
mal algum sobreiro visse ao chão seria lançado

num piscar de olho e trejeito
e muito padrinho ao lado
ei-lo já feito bancário
sobreiros derruba a eito a cumprir o desidério
dando-lhe cores de cruzada
torpes razões de mistério
arranca – rasga – trucida
tudo desmata o experto
faz da terra assim despida antecâmara do deserto

do deserto ou do inferno
que há já p’r’aí quem duvide deste mau feitio eterno
e vê-lo infrene em tal lide
sanha tal em que se engolfa
lá diga à boca pequena
que ele quer é campos de golfe
roubando à terra morena a verdura do arvoredo
p’ra gáudio só do turista
deixando à malta pequena alguns grãozitos de alpista

segue pois deficitário o povinho no pagode
nas mãos de algum salafrário
que come mais do que pode
que pode mais do que deve
que deve… ah quanto deve!…
jamais se lhe acaba o rol
e ele é campos de golfe e campos de futebol
para isso é um mar de água
só o campo morre à sede
sobra a fome… sobra a mágoa

e no entanto olhai – vede
como ele medra e prospera
o grande artista sem rede a trepar à estratosfera
enquanto minga o portuga entre golfe e futebóis
com tanta relva trânsfuga
lá petisca uns caracóis
entalado na fartura do viver sem estribeira

ficou mole a dita dura
encrespado o mar da asneira
e há tanto médico à cura deste mal de pasmaceira
que há-de ‘inda morrer da cura
este povo que premeia o viver à lei da selva
e ruminante toupeira que de verde só tem relva
p’r’além do verde só mato
mal a esperança mora em Huelva
há que dar corda ao sapato

mas… luz se faz no horizonte
ao céu se abre o olhar mais puro que a pura fonte
‘inda mais leve que o ar
vem um constâncio que prega – que praga! –
contra a tormenta dos tempos de cegarrega
– que a malta já nem aguenta!… –
contra ventos e ordenados
aumentos e outros dinheiros
nos campos abandonados há que plantar sobreiros
que preciso é cuidar bem
com carinho e com justiça
do pouco que o povo tem…
e pô-lo a comer cortiça!

– Jorge Castro