A propósito do Dia Internacional da Mulher – que considero uma baboseira, pois ao contrário do Natal, o dia da Mulher é todos os dias, quer se queira quer não – ocorre-me discorrer um pouco sobre uma notícia que veio a lume (Público) no dia 05 do corrente:

A Comissão de Assuntos Constitucionais discorreu sobre a criminalização da mutilação genital feminina (ablação do clítoris), prática vulgar ou comum em vários países africanos. Por força de importações culturais, há já conhecimento da sua ocorrência em território português, nomeadamente na comunidade muçulmana guineense.

Até aqui, tudo bem. Legisle-se e criminalize-se tal prática. À falta de melhor, com a invocação de um antigo argumento: em Portugal, sê português! E quem quiser cortar alguma coisa, que se entretenha a cortá-la a si mesmo e deixe os demais sossegados.

Não posso, no entanto, deixar de me abismar com algumas questões colocadas em sede parlamentar sobre esta matéria, como: “a importância do clítoris é algo subjectiva…”; “a sua mutilação não afecta nenhuma função vital” nomeadamente “a função reprodutiva”…

Parece que estas angústias advêm do facto do Código Penal apenas prever penas de 2 a 10 anos de prisão para quem “ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa por forma a privá-lo de importante órgão ou membro ou a desfigurá-lo grave e permanentemente” (artº. 144º). Ocorre que parece haver deputados que têm dúvidas sobre se o clítoris poderá ser chamado de órgão ou membro e – pior ainda – se será importante… Claro que considerar o prazer sexual uma função vital não há-de caber no bestunto de tamanhos angustiados.

Realmente, nós temos peculiaridades curiosas enquanto bicharada que legisla! Finalmente percebo porque é a “facada nas costas” uma prática tão corriqueira e comunmente aceite cá pelo burgo. Desde que dada com jeito e não afectando nenhum órgão importante, estejam à vontade, que a lei não criminaliza.

Pergunto-me se uma discreta lobotomia perpetrada em quem manifesta dúvidas daquele teor poderá ser considerada crime…