não há páginas em branco

não há páginas em branco
no decurso destes dias
nem palavras por dizer
momentos não preenchidos
em cada hausto ou sentir
num caminho percorrido

não há nada além da vida
– e está sempre a acontecer –
além do que ela convida
sem fim
princípio
ou medida…

e eu sinto o sol vadio numa tarde entardecida
a aconchegar-me o consolo de ser tão feito de tudo
eu que de um nada sou feito
ficando mais a meu jeito este preceito absurdo
de ser mar à superfície
mas ser abismo profundo

e ser só essa a razão
que nos traz razão ao mundo.

Portugal (acróstico)

Por mares nunca dantes navegados
Ou porque tudo nele são sulcos já trilhados
Remos que nas ondas deixam rastos
Tantos como os braços e as velas e os mastros
Uns que apontam para os astros outros fundos
Guiados por se crer haver mais mundos
Além deste em que se pena e desespera
Lá ao longe há um futuro à nossa espera.

Paris, 13 de Novembro de 2015

não há céu nem mar
nem tanto azul
nesse tanto sangue rubro derramado
nem nos fica tanto assim
lá para o sul
a urgência do saber ser solidário

é tão rubro e é tanto o sangramento
desse jovem que estilhaços dilaceram
que o horizonte todo ele se avermelha
e inflama um olhar tão sempre à espera

e o sangue é igual nessa corrente
sem ter cor de pele
nem rosto
nem idade
e é um rio
que se espraia numa rua
qu’inda há pouco era o centro da cidade

é um rio
cujas margens em vertigem
nos fazem soar ao longe
na nascente
de Brecht
um poema recorrente:

Do rio que tudo arrasta se diz que é violento.
Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem

mas nem tudo é sempre igual
que tudo muda
só nos resta perceber
o que é diferente…

sugestão/convite – FOLIO, em Óbidos

Amizades,
No próximo domingo, dia 25 de Outubro, a partir das 15h30, em Óbidos, numa acção integrada no conjunto de eventos em redor da literatura (FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos – ver aqui: https://www.facebook.com/foliofestival) que por lá tem estado a decorrer e em acção organizada pela livraria Ler Devagar, irei dar um arzinho da minha graça, como poeta convidado.
O tema que propus: «Porquê um poema?» – pretexto tão bom como outro qualquer para nos permitir discorrer sobre o que nos der na gana…
Entretanto, contarei com uma roda de amigos, também com coisas para dizer, e alguma música. A entrada é livre. O local – uma casa particular ali para os lados da igreja e disponibilizada para o efeito – creio que não há que enganar.
Apareçam. Quem sabe, não poderemos fazer um brinde juntos…
Abraços.

sugestão

Dia 3 de Outubro, sábado, pelas 17 horas, em Carcavelos,
 na Sociedade Recreativa Musical de Carcavelos, 
o encerramento da «campanha» de homenagem a António Feio:

E cá fica parte do meu contributo:

A propósito do poema de António Feio (Tenho dez linhas…

dirigido a seu irmão Carlos Peres Feio 

dez as linhas e não mais do que dez linhas, 
nove sendo pois aquela já foi gasta 
oito agora e bem mais do que as vizinhas 
sete sendo em vitória de canasta 
seis espreitam num enlevo de andorinhas 
cinco dedos desta mão que a mim me basta 
quatro irmãos entretidos nos caminhos 
três destinos que se cumprem de seguida 
dois já idos e outros dois entre carinhos 
um amor que se quer além da vida. 

– Jorge Castro