Paris, 13 de Novembro de 2015

não há céu nem mar
nem tanto azul
nesse tanto sangue rubro derramado
nem nos fica tanto assim
lá para o sul
a urgência do saber ser solidário

é tão rubro e é tanto o sangramento
desse jovem que estilhaços dilaceram
que o horizonte todo ele se avermelha
e inflama um olhar tão sempre à espera

e o sangue é igual nessa corrente
sem ter cor de pele
nem rosto
nem idade
e é um rio
que se espraia numa rua
qu’inda há pouco era o centro da cidade

é um rio
cujas margens em vertigem
nos fazem soar ao longe
na nascente
de Brecht
um poema recorrente:

Do rio que tudo arrasta se diz que é violento.
Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem

mas nem tudo é sempre igual
que tudo muda
só nos resta perceber
o que é diferente…

um ligeiríssimo contributo…

Tanto se fala (mais à direita, claro) de legitimidades democráticas e outras coisas a modos que assim, que me lembrei de lançar mão de umas contitas que aqui partilho, para ver se se percebe o que está a acontecer na Assembleia da República, à luz de uma outra coisa que se chama Constituição da República Portuguesa:
Resultados eleitorais em Outubro de 2015:
PàF – PSD+CDS (tudo somadinho…) – 2.082.511 votos


– PS      – 1.747.685 votos
– BE     –    550.892 votos
– CDU  –   445.980 votos
– PAN –      75.140 votos
                      TOTAL destes 4 grupos – 2.819.697 votos

A dúvida que se me coloca:

– Qual é a parte da Democracia que os senhores da coligação fundida, que andam tão desesperados e exaltados, não está a perceber?

Tanta dor, senhor doutor…!

(retirado de Yronikamente, com a devida vénia)

O apego cego e tão pouco democrático ao poder, o argumentário, que de tão contraditório é esquizofrénico, a raiva incontida que desce, com frequência, ao insulto político ao nível de disputa entre vizinhas histéricas, a futurologia catastrófica… que dizer mais de quantos notabilíssimos comentadores da chamada direita portuguesa arrepelam os cabelos, por estes dias, qual coro dos aflitos de novo tipo, em face de uma possível modificação das passadas a que o baile mandado do sacrossanto «arco da governação» nos habituou? 

Eu, cidadão, muito se me dá, hoje, que um possível governo de esquerda… governe. Quer gostem ou não as sumidades do comentário televisivo, isso decorre do regime democrático, ponto final! Se possível, que esse governo, como se espera, assuma diferente feição daquela conhecida a que nos votou a perversão neoliberal (onde alguns «socialistas da oportunidade» também navegam…) – que, essa sim, meteu a social-democracia não na gaveta, mas nos esconsos mais pútridos de tantas subcaves de interesses. 
E é vê-los que, ao longo de quatro anos, com arrogância inaudita mas atoleimada, cuspiram, espezinharam, ignoraram ou, sempre que lhes ocorria, gozaram à fartazana com tudo quanto é oposição, com o PS incluído e em destaque, estarem agora a perorar amarguras e crocodilinas lágrimas perante o desprezo olímpico com que António Costa os mimoseou na Assembleia da República.
Entretanto, recorrem à habitual castração pelo medo: ele é os mercados, ele é o Banco Central, ele é a conjuntura internacional… ele é o Diabo, como prova aparentemente inequívoca (para esta gente) de que «Deus nem sempre é bom para os homens», conforme Calvão dixit.
O que sobressalta é tentar apurar em que recôndita parte da anatomia – aquela onde, porventura, o próprio Deus é Diabo – é que esta gente guarda o conceito de Democracia. Talvez tão-só onde o Sol não brilhe… 
Enfim, como pedra cimeira deste arco imperfeito da governação, ainda não estou convencido de que o senhor presidente da República não se assuma mais como o conjurado de Boliqueime e dê luz verde ao governo proposto por António Costa. Só nos faltava mesmo este para transformar em cinza este sol radioso que hoje, em São Martinho antecipado, teima em nos iluminar…

fui, foste, fomos a Óbidos
ao FÓLIO, na Casa dos Poetas com a Ler Devagar

Ei-los, em 25 de Outubro, por Óbidos, com açúcar e com afecto…
Não há muito para dizer para além do que por lá foi dito, ficando, assim, tudo por dizer para quem lá não foi. Na verdade, nestas vidas participativas… o interessante é mesmo participar, se me permitem a redundância jocosa. O relato posterior tem, como sabem, sempre muito menos graça.
Um dos ex libris da FÓLIO de 2015, o Elefante Salomão

A convite de José Pinho, da livraria Ler Devagar e pela Casa dos Poetas, foi-me proposta a organização de uma sessão de poemas que, inevitável e gostosamente, tive de associar aos tempos gloriosos da Poesia Vadia, na Ler Devagar do Bairro Alto, sob a égide de Pedro Mota, entre 2000 e 2005, grande alfobre de neófitos nos árduos caminhos de um poema. 
Assim, do mesmo modo e pelo mesmo modelo, entendi por bem estender o convite a quantos amigos quisessem partilhar comigo aquela oportunidade.

– Jorge Castro

Como amiúde ocorre nestas «vidas», um pequeno desfasamento temporal fez-nos aguardar que a porta do interessante local onde a sessão iria ter lugar se abrisse, o que nos proporcionou um tempo extra para colocar conversas e projectos em dia. 

Eis que, entretanto, a porta se abriu para apurarmos porquê um poema?… 

– Walter Lopes, que pontuou toda a sessão com a sua mestria

– Jorge Castro

parte do grupo de convidados

– Ana T. Freitas

– Rosário Freitas

– Francisco Queiroz

– Eduardo Martins
– Alzira Carrilho 

– Ana Maria Patacho

– Carlos Peres Feio

– Maria Diniz

– uma ilustre desconhecida de quem, lamentavelmente, não retive o nome; alguém sabe?

– ao centro, Maria Mestre que se esquecera da voz em casa, pelo que encontrou alguém que lha emprestasse, na pessoa da Ana T. Freitas…
E lá fomos, ronda a ronda, sem rumo predeterminado e sempre tendo em vista o horizonte, que se quer virtual, fugaz ou passageiro… 

Não eram muitos os lugares para a assistência, que foi evoluindo ao longo da sessão e ao sabor das chuvadas que se entretinham a pontuar o fundo musical do Walter Lopes com uma cadência muito própria. Entretanto, pela vila de Óbidos, decorriam muitos outros eventos literários, em simultâneo, Ou seja, entre a chuva e a «concorrência», a mão-cheia de assistentes que por ali foram passando, acabaram por ser uma verdadeira multidão…  

O Elefante Salomão partiu, então, para outras paragens, segundo tudo leva a crer, até ao próximo ano.

Momento de despedida feérica e algo olorosa…

O nosso anfitrião, José Pinho, da Ler Devagar, surpreendeu-nos com o convite para um jantar que nos caiu muito bem, que isto de amar muito também cansa, mas cujo anúncio muito tardio não permitiu, com grande pena nossa, que todos pudessem estar presentes.

E militantemente regressámos à Casa dos Poetas, para as rondas finais – pois que a sessão estava aprazada até às 24 horas – e nunca é demais qualquer oportunidade para uma boa mão cheia de afectos temperados com poemas, assim a modos que digestivo de circunstância… e até para o ano!
– Fotografias de Lourdes Calmeiro

sugestão/convite – FOLIO, em Óbidos

Amizades,
No próximo domingo, dia 25 de Outubro, a partir das 15h30, em Óbidos, numa acção integrada no conjunto de eventos em redor da literatura (FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos – ver aqui: https://www.facebook.com/foliofestival) que por lá tem estado a decorrer e em acção organizada pela livraria Ler Devagar, irei dar um arzinho da minha graça, como poeta convidado.
O tema que propus: «Porquê um poema?» – pretexto tão bom como outro qualquer para nos permitir discorrer sobre o que nos der na gana…
Entretanto, contarei com uma roda de amigos, também com coisas para dizer, e alguma música. A entrada é livre. O local – uma casa particular ali para os lados da igreja e disponibilizada para o efeito – creio que não há que enganar.
Apareçam. Quem sabe, não poderemos fazer um brinde juntos…
Abraços.