Trazer uma poetisa como convidada a uma sessão de Noites com Poemas, muito para além de aparente redundância, é uma afoiteza pouco comum na matriz que se desenvolveu ao longo de cada uma das nossas sessões…
… e vão contadas 74. Na verdade, as múltiplas facetas da vida e dos saberes que nos vão sendo trazidas por cada convidado, constituem elas outros tantos desafios à criatividade, na diversidade de olhares a que cada participante se sinta impelido.
Assim, então, Maria Azenha. Afável, amena, incisiva e irónica, sofrida e. logo mais, contundente e afirmativa; lírica, sim, mas terrena e terreal; dona de uma bela voz e de correspondente arte de dizer…
… coube-lhe a ela a missão de engrandecer esta sessão e a nós o privilégio de a termos connosco. Carlos Peres Feio sublinhou o acolhimento e a apresentação da autora, de quem acabámos por descobrir percursos próximos…
… para além dos afectos comuns, circunstância sempre presente neste Portugal tão pequeno de geografia como imenso na arte dos afectos e das cumplicidades – e aqui se fala das boas cumplicidades, das que sabem e fazem bem a quantos queiram embarcar em navegações deste quilate.
Como sempre – ó vaidade das vaidades – a sala apresentou-se bem preenchida e palpitante de vida…
… dispensando farto aplauso a Maria Azenha, realçado por espontâneas declarações de gratidão e apreço de muitos dos presentes.
Dir-me-ão que tudo isso não irá além da palavra de circunstância, do afago que pouco custa e cai sempre bem… Será. Ou talvez não. Talvez seja, isso sim, o reconhecimento por mérito assumido publicamente, onde a exposição de cada um vale como assinatura lavrada em testemunho.
E foram, na verdade, muitos a assumi-lo. Porque ali estamos, reunidos e encontrados uns com os outros por acto voluntário e determinado, sacudindo grilhetas de comodismo e conformismo, dando e recebendo o que de melhor cada um traz para partilhar.
E não sendo isso o bastante para mudar o mundo, certo é ser isso mesmo o bastante para o manter a rodar.
A entrega da certidão com que a Vereação da Cultura da Câmara Municipal de Cascais, solidária com esta iniciativa de munícipes, sempre faz questão de agraciar cada um dos nossos convidados e que tem, obviamente, sempre o melhor acolhimento.
Depois, como sempre, a hora de dar voz a quem esteve a ouvir. E, uma vez mais, foram muitos a dar o passo:
– Maris Francília Pinheiro
– Hélio Proença
– Ana Teixeira Freitas
– João Baptista Coelho
– Rosário Freitas
– Eduardo Martins
– Francisco José Lampreia
– Miguel Partidário
– Emília Azevedo
– Luís Perdigão
– Tina
– Fotografias de Lídia Castro e de Lourdes Calmeiro
E deixo-vos com um poema de Maria Azenha que me caiu especialmente no goto:
Para o primeiro dia do ano
a tarde não está para versos e a noite
irá varrer todos os passos do primeiro dia do ano.
é no hall de entrada das ruas, junto aos caixotes de lixo,
que lisboa desaba.
há quem diga que as plantas não passam fome,
nem sofrem de solidão.
vendo bem ou vendo mal qualquer verso magoa
– Maria Azenha
Uma excelente noite, recheada de boa poesia.
Parabéns Jorge Castro. Maria Azenha é uma poeta que nos entra na alma através dos seus poemas e da forma como tão bem os diz.
Até à próxima tertúlia.
Rosário Freitas
tempo de sombras, mas o poema é luminoso…
abraço, abraços…
Estive presente no evento e não concordo quando se refere à Poeta Maria Azenha, como "sofrida", além de não ser elegante, não se trata assim nenhum autor.
O que Maria Azenha, nos levou, foi a sua obra e é a essa que nos devemos dirigir nada mais. Nada mais.
António Antunes
Caro António Antunes,
Há quem ao ver a árvore se perca da floresta e há, também, quem vendo a floresta, perca a individualidade da árvore.
O seu comentário será muito respeitável, como, aliás, todo e qualquer outro cujo autor se digne perder precioso tempo com este pobre blog. Mas, convenhamos, que afirmar que eu chamo «sofrida» à poetisa Maria Azenha é um manifesto caso de fraca pontaria.
Não viu, também, expressões como afável, amena, incisiva e irónica, sofrida e, logo mais, contundente e afirmativa; lírica, sim, mas terrena e terreal…? Então (ou)viu pouco.
Repare, eu considero-me um escrevinhador sofrido. E ainda bem que o serei, pois se não o fosse por onde andaria a minha sensibilidade face ao desconchavo do mundo?
Agora, trocar a apreciação sobre a poetisa que é Maria Azenha e a sua obra – que é aqui o que está em apreço, como é óbvio – e a pessoa que ela é, colocando na minha boca tal intenção desculpar-me-á mas isso é abuso que eu não admito.
A iliteracia é uma maleita perigosa e pior se temperada pela vontade da maledicência.
No entanto, por aqui ficamos. O meu amigo engalinhou com o termo «sofrida». Pois, olhe, eu acho-lhe graça…!
Ainda a propósito, caro António Antunes, não me diga que trocou o termo «sofrida» por «sofrível», no seu entendimento… É que a língua portuguesa tem voltinhas danadas para a brincadeira.
Veja bem que até o fado é uma canção sofrida, ainda que lhe faltem alguns outros atributos que à Maria Azenha sobram…