Inicio, então, uma selecção possível das muito largas centenas de imagens que colhi destes dias, um pouco mais longe da urbe esmagadora, em busca de raízes e de algum sossego…

dia 2 de Setembro – Maria Estela Guedes, a nossa anfitriã, durante o Filo-Café, em Lamego, exibe algumas das pinturas de Aline Daka presentes no evento, pintora brasileira do Rio Grande do Sul, salvo erro, e que nos acompanharia no passeio.dia 3 – Manhã cedo, rumo à Torre de Ucanha (concelho de Tarouca), monumento de que já existe documento a referir-se-lhe no século XII, destinado a defesa, ostentação senhorial e cobrança de impostos, como refere José Leite de Vasconcelos, e de que os frades de Salzedas colheram farto benefício. Muito fácil o deixarmo-nos enlear pelo ambiente e permitir que a nossa imaginação nos transporte até àqueles tempos medievos.
José Leite Vasconcelos, o eminente filólogo e etnólogo, nascido em Ucanha, tendo ali a sua casa ainda em confortável estado de conservação.

A ponte, muito possivelmente romana, que conduz à Torre, sobre o rio Varosa, não é alheia àquele encantamento, pelo contrário o favorece, ainda que toda a quietude pressentida na paisagem iluda, a bem do nosso devaneio, a rudeza e dureza daqueles tempos idos.

Do interior da Torre de Ucanha, um relance da torre da Igreja Paroquial, cujo interior merece bem uma visita cuidada e de olhar atento a particularidades curiosíssimas, nas imagens, nos retábulos… É só irem lá ver!

Passeando por Ucanha, à descoberta das virtudes sem fim dos produtos do sabugueiro, descobrimos uma loja de artesanato e produtos da terra, que nos abalou o horário que carecia de ser seguido à risca, de tão ambicioso.


Mas nem queiram saber o sabor dos velhos tempos daquelas maçãs! E das uvas? E dos figos? E…

Entre doces e outros pecados, lá vislumbrámos o chá de sabugueiro, tisana infalível no combate à gripe, à osteoporose e à anemia. Não sou eu que o digo. Apenas aqui o transmito. Depois, o melhor é experimentá-lo…

De seguida, ainda no concelho de Tarouca, rumámos a Salzedas, de que se mostra a fachada da Igreja do Mosteiro.

Aqui interessa parar um pouco e referir que foi este Mosteiro mandado erigir por D. Teresa Afonso, esposa de Egas Moniz (séc. XII), e entregue por esta à Ordem de Cister, assumindo o nome de Mosteiro de Santa Maria de Salzedas.

Tendo chegado a ser um dos maiores e mais ricos mosteiros portugueses e ostentando, ainda, uma inegável monumentalidade, é no entanto, de bradar aos céus o estado em que se encontra. Sucessivos arranjos e acrescentos apresentam-no num estado caótico, emporcalhado e semi-arruinado.

Os fluxos de dinheiro que têm vindo a ser injectados na sua recuperação parecem sumir-se sem deixar rasto.

Para além da confusão arquitectónica das «novidades» que têm vindo a ser erigidas sobre as pedras matriciais, e como referiu alguém do nosso grupo, uma singela limpeza do pó, por si só, conferiria alguma da dignidade que, no momento, lhe falta.

Entende-se tudo isto numa perspectiva muito negra quando temos veleidades de ser um destino turístico de qualidade. Isto, por um lado, porque, pelo outro, o que a mim mais me incomoda é o destrato e desrespeito com que tratámos o nosso passado e nós próprios

Logo mais, em busca da Judiaria – bairro medieval de Salzedas, onde as aberrações também pululam… – afogam-se mágoas e amarguras na generosidade de alguns habitantes que, na faina das vindimas, presentearam o grupo com farto fornecimento de uvas acabadinhas de apanhar.

Regresso à nossa base, em Britiande, onde retemperámos forças à volta de um cabrito assado e um pequeno passeio a pé, para desmoer e preparar a aventura da tarde, enchendo os olhos com as cores outonais…

Depois, novo destino: Capela de São Pedro de Balsemão, junto ao rio do mesmo nome, aí a uns três quilómetros de Lamego. Erigido lá pelo século VII (ou IX, segundo alguns), também aqui tendemos a deixar-nos levar, tempos afora, pelo cenário que nos envolve.

A imagem acima, resgatada pela senhora que tão simpaticamente nos guiou numa visita, ostenta essa peculiaridade de estar a santa apoiada sobre o mundo, mundo que uma cobra (ou dragão) envolve…

… e que nos deixa em estado de grande cepticismo quanto a interpretações apressadas sobre o significado de tal enquadramento, reiteradamente observado em inúmeras imagens congéneres.

De facto a Senhora não pisa a cobra – a Sabedoria – mas apoia-se, antes, no mundo, sendo que a cobra o envolve… Qual a mais verdadeira interpretação?

A coluna mais ao fundo ainda pertence ao monumento original, sendo assim um pouco mais antiga que todos os anos de idade somados dos presentes… e outro tanto e mais outro, etc.

Ao longo do rio Balsemão, regressámos a Lamego. No próximo bloco de imagens, a continuação da história. Até lá.