Volto a dizer que não sou um incondicional ou, sequer, grande aficionado do flamenco. Há coisas assim, ou nos estão entranhadas e gostamos, mesmo sem preocupações de porquês, ou lhes reconhecemos mestria na interpretação, podem mesmo chegar a «mexer» connosco, mas fica-nos sempre um distanciamento de alma, a que alguns chamam cultura.
Mas também a idade nos pode (e deve, digo eu) refinar o gosto e torná-lo mais abrangente, para além da mera condescendência. Vem à colação a exibição de Gema Jiménez a que assisti na Fábrica da Pólvora, em Barcarena, integrada no festival Sete Sóis Sete Luas.
Excelentemente acompanhada por um guitarrista de primeira água – onde e como é que, a propósito, os espanhóis cultivam tanto guitarrista de qualidade…? -, assistimos a uma demonstração mais da força e vontade de viver (mesmo quando da morte se fala), em que nuestros hermanos são pródigos.
Dois dançarinos mais completaram o bouquet flamenco, também eles com aquele batimento de palmas impossível de acompanhar, a não ser por iniciados, e com uma fúria no sapateado de nos pôr os cabelos em pé.
Lá está: proporcionaram a quem assistiu, sem grandes problemas de divergências ou distanciamentos culturais, um despertar de emoções… E é suposto ser para isso que a Arte serve.
Uma pobre nota: algumas debandadas de público em plena actuação – e porque custará a crer que a todos tenha assolado uma simultânea e intempestiva necessidade de deslocação aos lavabos – denota um lamentável desrespeito quer pelos artistas, quer pelos espectadores ineteressados e denuncia a grosseria em que o portuga anda a deixar-se mergulhar.
Mais alto do que a intensidade do sapateado, fez-se sentir o som cavalar dos cascos de tanta besta!