Amigo e poeta, brindou-me Manuel Filipe com mais um trabalho seu publicado pela Apenas Livros. E digo brindou-me bem ciente do que vos digo, pois o Manuel Filipe partilha comigo esse estar na poesia tão só por gosto, pelo fluir fruído das palavras, sem peias nem constrangimentos para além daqueles que ele próprio se imponha.

Acabado de chegar de um aprazível encontro, leio todo este livro de um fôlego. E ganho alento. Deixo-vos com dois poemas de Nas Palmas da Noite, na convicção de que estou a partilhar convosco o que de melhor me acontece. Podereis avaliar:

O FUNÂMBULO

O funâmbulo encontra no trajecto o seu alento,
por um fio de aço, ascendendo, contra o tempo.

O olhar busca o frágil vulto desterrado,
num esplendor de projectores, encandeado.

Por uma eternidade parecera dar-lhe o vento,
(estivera um instante ausente, e desatento).

Só, no espaço, sua atenção é exigida,
pois apenas um arame o prende à vida.

Mas desliza, agita o ar, num gesto alado,
e sobe ao refúgio, no zimbório prateado.

O PINTASSILGO

Num dia claro
uma ave – um pintassilgo –
vem-me dizer
que o silêncio
é um lugar cinzento
onde viver.

– Desperto o silêncio.
Diz
perto
o pintassilgo.

– Morrerei se emudecer.

– poemas de Manuel Filipe