Porque se trata de um sentido grito de corpo e alma, que subscrevo sem hesitar, com vénia e aplauso, hoje aqui vos deixo as palavras – que digo eu? – o manifesto que a minha amiga e cúmplice de poesias “deSaraComAmor” nos ofereceu, no 1º de Maio, no seu blog “Poemas de Trazer Por Casa e Outras Estórias“, em que eu tenho, também, o gozo e a honra de colaborar:

“Uma das componentes mais marcantes da natureza humana: a necessidade de agir sobre o meio ambiental e social, produzindo bens alimentares, bem-estar, saber, riqueza material, artística, científica, progresso. Trabalhar. Um direito, um dever, uma necessidade, um vício, um escape, um objectivo, uma benção, uma seca, um castigo mas, sobretudo, uma forma de estar e de ser. Somos também aquilo que fazemos. Quem se sente realizado no seu, tem aí uma fonte de juventude e saúde mental. Quem se sente injustiçado no seu, quem se sente maltratado, quem se sente explorado, assediado, incompreendido, preterido, aniquilado, tem aí uma fonte de amargura que envenena o quotidiano. Por vezes, quem o tem, lamenta-o, quem o não tem busca-o. Quem o procura desespera, quem o perde sente o maior vazio da sua existência. Quem o deixa ficar rotineiro e vazio, definha. Quem se impõe metas e desafios rejuvenesce. Quem se entrega, morre. Quem não luta pela melhoria de condições no seu, dá força à forte corrente do poder. Quem aprendeu a calar cedeu ao medo. E cada vez mais o círculo se estreita à volta do trabalhador, neste pequeno Portugal como no mundo inteiro. Este é visto como uma força motriz, um compto, um dígito positivo ou negativo, um alvo a abater ou a promover, conforme o interesse do momento. Os imperativos do lucro, definem o destino do indivíduo, alteram-lhe os planos, a estabilidade, o génio, a vida familiar. A justificação do défice faz-se na plataforma laboral, sacrifica-se na condição laboral, traduz-se no arruinar de vidas, com a conivência e incentivo do Estado. Este é o árbitro silencioso das vidas anónimas. Agora cada vez mais, é o propulsor da instabilidade, porque cada mudança é uma medida economicista susceptível de arredondar as vidas, ao arredondar défices, provocados estes por quem não soube gerir a economia de um país.

Sou professora. Em meia dezena de decretos vi a minha família separada, o meu local de trabalho mudado, o horário de trabalho aumentado, os meus direitos adquiridos esmagados, o meu tempo limitado, o meu grupo de docência alterado, com mais quinhentas pessoas à minha frente para efeitos de concurso, a minha criatividade cerceada, a minha progressão na carreira congelada, a minha idade de reforma aumentada em mais de seis anos e a minha dignidade profissional posta em causa. Sei de quem não tenha sequer conseguido ainda um lugar nesta escalada, apesar de lhe ter sido proporcionada a formação adequada. Sei dos jovens deste país no fim de uma interminável listagem sem esperança. Sei das fábricas paradas, dos campos desertos e lamento. Lamento um país que não soube dimensionar a educação, a formação profissional, o investimento, a produção, e resolve agora moralizar cegamente aqueles que apenas pretendem exercer o seu direito ao trabalho.

Por isso hoje, penso em todos aqueles que foram esmagados pela roda desatenta do progresso, assim lhe chamam preversamente. E sem demagogia, sem pretensões moralistas, apetece-me saudar os que resistem, incutir esperança aos que esperam, animar os que sucumbem, desejar a todos a realização possível no trabalho, a felicidade única de fazer parte de um todo com uma tarefa a cumprir.

Bom dia do Trabalhador!”

publicado por deSaraComAmor