tenho apenas estas mãos
vês?

tenho apenas destes passos
os caminhos
que já nem me sobram no tempo
nem são ninhos
tenho apenas esta dor apaziguada
tenho o nada
quase tudo construído
ao rés da água
calosidades de mágoa
que me sobram do regato
em que me vês
e deslaço
o pretérito embaraço de ser tudo e quase nada
e assim sou

por onde vou
por onde passo
de nada sou
mas sou tudo quanto faço
sou o espaço
onde se cria este tempo
este passo que define a vida toda
porque eu sou
‘inda que morra
e deixo de mim o espaço
que tu virás
e trarás no regaço a vida toda

e eu ta darei
‘inda viva
‘inda que doa
com estas mãos que apenas tenho
vês?
onde trago de meus pais a vida toda.

– Jorge Castro