a sombra da pomba na parede do prédio
como um voo agreste de açor clandestino
a sombra da pomba é um rasto um assédio
como um voo planado por sobre o destino
a sombra da pomba é um mal sem remédio
como um voo sem asas de sonho menino
a sombra da pomba é o salto intermédio
como um voo urbano sem rumo sem tino
a sombra da pomba é a sombra da sombra
sem um prédio um assédio um remédio ou sem tino
como um voo intermédio entre o sonho e o destino.

– de Jorge Castro


… e das paredes urbanas soltou-se um eco, de um companheiro de poesias, que vem a propósito:

A sombra que ensombra a parede do prédio
não mais faz que sombra mas não é assédio
que a sombra que pesa quando é prepotente
e não vem de luz mas nasce de gente
é a força mais forte de ser violência
num nojo de abuso demente sem pejo
que a própria demência esconde ao desejo
do egocentrismo sem conta nem pejo
e fere mais fundo que a ferida maior
não é deste mundo, é apenas dor
de nos violarem até ao tutano
com requintes ébrios de mau predador
que não é urbano, é verme menor
que não é humano, é bosta e bolor
que saiu do estrume e ao estrume regressa
rezai com fervor: que o faça depressa!…
e então, finalmente,
que não se disfarce, não finja ser gente
e o mundo lhe dê o quanto merecer:
uma cova calcada de terra pesada,
seu nome gravado cá em cima, “Estupor”,
e o letreiro podre “Que descanse em dor”!

– de Pedro Laranjeira