Natal

Trazias contigo cânticos

Querubins e os presépios

Entre tanta doçaria de cada avó prazenteira

O ar quente da lareira entretecido em afecto

E era tão bom ser neto sentado em banco de pau

O gato e o cão por perto

Anseios pelo pitéu

Lambidelas a preceito de rapar com alegria

O tacho da aletria e o molho das rabanadas

E no ar o vozear de fazer a nossa casa

Ser do tamanho da aldeia

Cheia dos pequenos nadas que fazem do lar o ninho

E havia sempre alguém a sentar-se à nossa mesa

Só para não ficar sozinho

Depois o tempo correu

E tanta água fluiu sob as pontes da cidade

Que algo de mim partiu

Fazendo nascer um frio que me cresce com a idade…

Natal

Ainda se fosses mar e eu o navio

Se fosses céu e eu a nuvem

Se fosses jardim e eu o perfume

Se fosses amor e eu o desejo

Se fosses terra e eu a semente

Teríamos a cumplicidade que há na alma das coisas

Esse tal que nem se explica

Que ali está e que ali fica

Porque sim

Porque é assim que se cumprem os mistérios insondáveis

Dos abismos quotidianos e dos montes sublimados

Natal de eu ser tão pequeno

De não me perder de ti

(Estou aqui todos os anos…)

E tu

Onde te encontrar?

Como te hei-de chamar nas tuas vestes de enganos
?