(Portugal vive mais um entre-acto, entre o pindérico e a tragi-comédia, que não deixa, afinal, de nos causar mossa a todos. Serão os fados, talvez. Seremos nós.
Por vezes estranho este país. Por vezes sofro com ele. Mas estou aqui e respiro este ar que a todos nos toca. E não consigo ficar indiferente.)
Colhemos rosas no mar
Cheias de espinhos
E não há pão nestas redes sobre a terra
Ficam-se as mãos estendidas para o destino
Ficam-se as mãos assim ao abandono
Laceradas num torpor
Num desalinho
Que nem gritam de fome
Sobrevivem
Emudecidas
Sem noção das alvoradas
Sobra-nos só esta urgência de cegueira
Perturbada por igual por outras pressas
De corrermos sempre à frente desta vida
Sem cuidarmos de saber que vida é esta
E atingido aquele final num dia-a-dia
Qualquer
De incertezas mais que certas
Damos por nós
Hirtos e quedos
Aborrecidos
Mais não restando de nós que alento incerto
Bastaria que no tempo sem sentido
Olhasses para as tuas mãos que tanto esqueces
E com elas construísses a alegria
De intervir
Na cumplicidade dos dias
De moldar
O barro dócil dos sentidos
Não as tendo como agora
Amolecidas
Neste tempo que sem mãos se entristece.
– Jorge Castro