A propósito da ‘entrada’ anterior, aqui vai um texto algo a propósito que ainda há pouco fiz e remeti aos meus amigos, empenhados em mares de escrita. Espero que vos seja útil.

LENDO “COMO UM ROMANCE”, DE DANIEL PENNAC

Oh amizades minhas feitas pelos caminhos das escritas!

Estou a ler um livro de um “colega” que me era, até há bem poucos dias, um ilustre e anónimo desconhecido. Mão amiga e fraterna o lançou nos meus braços. E a hora foi uma hora boa.

Para todos vocês que escrevem e lêem, que juntam as palavras que vos são queridas, proibidas, necessárias ou lúdicas e assim intentam preparar e projectar um futuro para a humanidade, aqui ficam as apresentações: Daniel Pennac. O livro: “Como Um Romance“, Edições Asa, colecção “Pequenos Prazeres“.

Este livro está a ser, para mim, uma rara delícia.O autor, além de romancista, é pai e professor. Julgo-o recomendável para os romancistas, para os pais e para os professores. Os poetas não menciono, pois para eles tudo será recomendável.

E ex-cito: “… nós, que lemos e que pretendemos propagar o amor ao livro, preferimos frequentemente ser comentadores, intérpretes, analistas, críticos, biógrafos, exegetas das obras que emudecem devido ao piedoso testemunho que damos da sua grandeza. Aprisionada na fortaleza da nossa competência, a palavra dos livros é substituída pela nossa palavra. Mais do que deixar a inteligência do texto falar por nosso intermédio, remetemo-nos à nossa própria inteligência, e falamos do texto. Não somos emissários do livro, mas os guardiões arregimentados de um Templo de que elogiamos as maravilhas com palavras que fecham portas…”

De repente, apeteceu-me oferecer a cada um de vós um exemplar.

O homem tem uma graça fluida no alerta para os direitos fundamentais do leitor: “o direito de não ler; o direito de saltar páginas; o direito de não acabar um livro; o direito de reler; o direito de ler não importa o quê; o direito de amar os “heróis” dos romances; o direito de ler não importa onde; o direito de saltar de livro em livro; o direito de ler em voz alta; o direito de não falar do que se leu”.

Subversivas e salutares recomendações ou lembranças, a nós tão perdidos em figurinos “oficiais”!

Se Cervantes encanta e Saramago assarapanta, Daniel Pennac – em comparação sem problemas de ortodoxia – está a deliciar-me. Cada página sua é um conjunto de desvelos em prol do livro, da sua intrínseca identidade e da sua cumplicidade pela leitura. Quase diria que me ajudou a reencontrar os meus próprios carris para a viagem que intento.

Como sempre e com esse fardo fantasmagórico da humildade, fica-me a dúvida quanto à objectividade da minha avaliação, para além da paixão súbita e passageira. Por isso, façam-me (e a vós mesmos) um favor: leiam-no e depois digam-me se não ficaram a respirar melhor.

Citação de encerramento: “O homem constrói casas porque está vivo, mas escreve livros porque sabe que é mortal. Vive em sociedade porque é gregário, mas lê porque se sente só… Os raros adultos que me deram livros a ler, fizeram-no sempre de modo muito discreto, e nunca me perguntaram se eu tinha compreendido. A esses, evidentemente, eu falava das minhas leituras. Vivos ou mortos, ofereço-lhes estas páginas.”.

Um abraço sem mais palavras.